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sábado, 23 de dezembro de 2017

A caverna cristalina

No dia 17 de dezembro de 2017, estive numa pequena feira vegana em São Caetano do Sul e lá conheci a escritora franco-brasileira Christiane de Murville, que promovia livros de sua autoria, entre os quais a série de fantasia científica A caverna cristalina, publicada em 2015 pela editora Chiado. Esse título não foi percebido pela pesquisa do Anuário Brasileiro de Literatura Fantástica quando de seu lançamento, devido a sabida dificuldade em identificar os livros que não chegam ao mercado e cujos autores não fazem parte ativa do fandom, como é o caso. Cristiane é doutora em Psicologia Clínica pela USP e já havia publicado trabalhos acadêmicos, mas esta série foi sua primeira incursão na ficção.
A série é formada por três volumes: Uma aventura no tempo, O desafio do labirinto e Capturados no tempo. todos bastante parrudos (416, 428 e 488 páginas, respectivamente). Conta sobre um grupo de pesquisadores que encontra uma caverna muito especial na Chapada Diamantina e, a partir de lá, espalha-se pelo tempo e pelas dimensões. A história vai além das questões puramente ligadas a tradição da ficção científica e avança sobre a filosofia oriental, a psicologia e outras correntes especulativas, construindo um painel autoral que escapa de uma classificação objetiva. Outro diferencial é que a série também teve edição na França.
Mais informações sobre estes e outros livros da autora podem ser encontrados no saite Livros & Esculturas, bem como podem ser adquiridos no saite da Editora Chiado, aqui.

domingo, 8 de maio de 2016

Números e listas da fcf&h em 2015

Está disponível para download gratuito a primeira edição do Almanaque da Arte Fantástica Brasileira, que dá sequência ao trabalho realizado até 2014 pelo Anuário Brasileiro de Arte Fantástica, com uma ampla lista de livros de literatura de ficção científica, fantasia e horror publicados no Brasil em 2015.
A proposta é a mesma do Anuário, de catalogar os lançamentos e relançamentos de fcf&h de autores nacionais e estrangeiros, albergando também as edições virtuais. A edição tem 34 páginas e relaciona 696 títulos, sendo 282 nacionais e 414 estrangeiros.
Apesar de ampla, a pesquisa não é absoluta, pois é praticamente impossível relacionar tudo o que se publica no país, uma vez que muitas edições são lançadas regionalmente e sua divulgação não alcança a pesquisa, mas o levantamento cumpre seus objetivos na medida em que, seguindo os mesmos critérios do Anuário, monta um panorama bastante confiável da publicação do gênero por aqui.
Podemos observar a evolução do mercado na figura abaixo, na qual foram computados, ano a ano desde 2004, os números da publicação de autores brasileiros (em azul), estrangeiros (em vermelho) e o total geral (em verde). Houve um crescimento contínuo e explosivo até 2010, quando a crise começou a se manifestar derrubando fortemente a quantidade de lançamentos do ano seguinte e, ainda que 2012 tenha sido o melhor ano do período estudado, desde então os números têm sofrido quedas sucessivas, especialmente no que se refere a publicação de autores locais, colocando o mercado de 2015 no pior patamar desde 2009.
Também percebemos que a publicação de autores nacionais, que havia superados a de estrangeiros traduzidos entre 2010 e 2013, em 2015 voltou a ficar bem abaixo, como também aconteceu em 2014. Isso é decorrente da recuperação da credibilidade do gênero entre as grandes editoras que, contudo, não se reflete positivamente para os autores nacionais porque elas preferem traduzir estrangeiros.
Mas as notícias não são ruins de todo, pois os lançamentos de 2015 mostram-se estáveis em relação ao ano anterior.
Para os mais curiosos, a última página do Almanaque relata todos os números de 2015, não apenas os totais, mas também os subtotais por formato e gênero. Os levantamentos dos anos anteriores podem ser obtidos nas edições do Anuário, algumas delas disponíveis gratuitamente aqui.

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Resenha: Nova ordem, de Chris Weitz

Mundo novo 2: Nova ordem (The new order), Chris Weitz. 266 páginas, tradução de Álvaro Hattnher. Editora Companhia das Letras, selo Seguinte. 2015.
O odisseia dos adolescentes em um mundo devastado por uma praga continua neste que é o segundo volume da saga iniciada em Mundo novo, publicado em 2014 pela mesma editora Companhia das Letras em seu selo Seguinte, cuja resenha pode ser lida aqui.
Jefferson é um nipoamericano novaiorquino que, depois de testemunhar seu mundo desmoronar e seu irmão mais velho sucumbir à doença, se vê na obrigação de assumir a liderança de seu pequeno mas determinado grupo de sobreviventes. Acompanhado de alguns garotos e garotas bons de briga, além do estranho e cerebral Crânio, partem para a missão de identificar o vírus mortal e encontrar uma cura, sem a qual estão todos condenados. Mas, para isso, têm de atravessar uma Nova York anarquizada, dividida em feudos em guerra, além de monstros antropófagos de quatro e de duas pernas. O primeiro volume se encerra quando, depois de enfrentar o bando de psicopatas liderado pelo último adulto vivo – que foi justamente o criador do vírus – a cura é obtida a partir do sangue de Jeff. Quando uma solução redentora parece próxima, os garotos são surpreendidos por um helicóptero da marinha, repleto de soldados que os capturam e levam para o alto mar. É justamente aqui que se inicia Nova ordem.
Jefferson, Crânio, Donna – que depois de muitos desencontros tinha iniciado um ardente idílio com Jefferson – e os demais sobreviventes já imunizados contra a doença, são aprisionados num porta-aviões fundeado ao largo da costa da cidade. A nave é americana, mas parece estar sendo controlada por oficiais britânicos. Ali, os meninos são submetidos a longos e intermináveis interrogatórios, e logo percebem que o mundo não sofreu com o vírus tanto quanto os Estados Unidos. Ainda há muitos adultos na Europa e em outros continentes, também imunizados contra o vírus, mas a ordem mundial está perturbada e instável. Muitos países desapareceram completamente, mas os que subsistem travam uma espécie de guerra fria, disputando os recursos deixados pelos que se foram. Para facilitar o trabalho, os sobreviventes decidiram abandonar a população dos EUA a própria sorte, esperando até que todos os seus habitantes morram para, depois, tomar seus recursos sem resistência. A cura encontrada por Jefferson é, assim, um grande problema para os planos dos novos senhores do mundo.
Quando os jovens começam a se adaptar a nova realidade de suas vidas, depois que o comandante do porta-aviões relaxa um pouco as suas prisões, os garotos são contatados por um grupo secreto de soldados americanos que querem retomar o controle dos EUA e levar para lá a cura de Jefferson. Depois de um rápido entrevero, os jovens embarcam num helicóptero para voltar para o continente, mas um deles fica para trás: Donna não consegue embarcar e é levada para Londres, onde outra fase de interrogatórios a aguarda. Lá, seus tutores dizem-lhe que todos no helicóptero morreram, e ela terá de superar a tristeza da perda de seus amigos e de seu grande amor. Mas o que Donna não sabe é que tudo o que lhe disseram é mentira.
De volta à Nova York, agora com a ajuda de alguns mariners, Jefferson e seus companheiros iniciam uma campanha de coalizão entre as diversas tribos de sobreviventes, usando a cura como um argumento incontestável. A princípio, as coisa parecem progredir de forma satisfatória, apesar de muitos riscos pelos quais o grupo tem de se sujeitar, mas o que nem Jefferson, nem o inteligentíssimo Crânio imaginam é que eles estão sendo manipulados e que um perigo ainda maior que a doença pode ser liberado no planeta.
Chris Weitz mais uma vez demonstra que sabe muito mais além de dirigir filmes. Seu texto é fluido, de descrições detalhadas e precisas que ajudam a construir as impressionantes imagens de uma Nova York em ruínas. Além disso, usa criativamente diversos recursos estilísticos e gráficos para dar voz individual a cada um dos personagens. Assim como no primeiro volume, o autor narra os acontecimentos através de depoimentos dos personagens, como se estivessem escrevendo um diário pessoal. Cada um deles tem seu próprio estilo narrativo e usa um linguajar diferenciado, com gramática e jargões próprios. Além disso, cada um deles tem sua própria tipologia, que também revela características de suas personalidades. Neste livro, outros além de Jefferson e Donna participam com depoimentos próprios, como o homossexual Peter, valoroso membro da equipe original, a agressiva Kath da tribo de Uptown, que ainda não sabe se ama ou odeia Jefferson, e principalmente o cerebral Crânio, cujo texto sem pontuações e parágrafos reproduz seu confuso fluxo de pensamento. A variedade de tipos e etnias também contribui para fazer a história ser mais que um romance para adolescentes, com muitas discussões sobre ética e intolerância em pauta.
Mundo novo revela ainda que teremos pelo menos mais uma sequência, uma vez que a história não tem uma conclusão, com ganchos poderosos que deixam o leitor ansioso pelo que há de vir. E nestes tempos em que as mídias audiovisuais estão em alta, fazer um leitor ansiar pela publicação de um livro é, sem dúvida, um feito admirável.

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

O essencial da literatura fantástica no Brasil em 2015

2015 foi o ano da crise. Não se falou em outra coisa ao longo do ano e praticamente todos os setores sentiram o impacto da desaceleração da economia brasileira. Ainda que haja um forte componente político no processo, não se pode negar que realmente aconteceu uma mudança de paradigma pois, com a desvalorização do Real, importar ficou mais caro e a produção interna e exportação voltaram a ser as bolas da vez. Alguns setores até obtiveram crescimento justamente por conta dessa mudança de contornos, mas o mercado editorial de ficção especulativa não reagiu da mesma forma porque o interesse das grandes editoras que dominam o mercado ainda está nos textos de autores estrangeiros, especialmente aqueles que vêm associados a lançamentos cinematográficos, por isso a produção nacional segue desprezada, subsistindo em pequenas editoras de nicho e na publicação autoral.
A queda nos números em relação a 2014 foi percebida em todos os setores editoriais, mas isso é assunto para outro artigo, que virá quando a lista de lançamentos de 2015 do Anuário Brasileiro de Literatura Fantástica estiver encerrada. Aqui, como em outros anos, falaremos do essencial que a fc&f apresentou em 2015, e não foi pouco. Mas antes, cabe fazer uma importante observação sobre o que foi o maior diferencial do mercado nesse ano: as volta vigorosa das novelizações.
Nos anos 1990, houve um período em que mercado foi dominado pela publicação de novelizações – também conhecidas como tie-ins – principalmente ligadas aos seriados de televisão Star trek e X files, sucessos que então sustentavam grandes clubes de fãs no País. Não é exatamente o que está acontecendo agora porque o mercado está muito maior e as franquias mais variadas, e com autores brasileiros aproveitando a onda. Além das sempre lembradas séries de tv, agora temos também novelizações de cinema (Star wars), séries de quadrinhos (Marvel) e jogos eletrônicos, com destaque para a novelização Dois mundos um herói (Suma das Letras), assinada pelo youtuber Rezende Evil e inspirada no jogo eletrônico Minecraft, que foi o lançamento mais badalado e comercialmente bem sucedido da fantasia nacional em 2015.
A fantasia continua sendo o gênero mais praticado pelo mercado, tomando mais da metade do total de lançamentos de literatura fantástica e é nela que se destacam os autores mais bem sucedidos, como Eduardo Spohr com o terceiro volume de série Filhos do Éden: Paraíso perdido (Verus), e Carolina Munhóz com Por um toque de ouro e O mundo das vozes silenciadas – este assinado em parceria com Sophia Abrahão –, ambos pela Rocco.
Dos autores mais identificados com o fandom, é preciso registrar a edição de Flores do jardim de Balaur, de Carlos Orsi, novela de fantasia heroica ao estilo weird originalmente publicada no fanzine Juvenatrix em 1999.
Felipe Castilho publicou o terceiro volume de sua série O legado folclórico: Ferro, água & escuridão (Gutenberg) que vale a pena conhecer, assim como o curioso Tijucamérica (Paralela), romance do cronista esportivo José Trajano, que envereda pelos caminhos do futebol.
A série Crônicas de Salicanda, de Pauline Alphen chegou ao terceiro volume com A aliança (L'alliance, Seguinte). Esta autora tem uma característica diferenciada: apesar de brasileira de nascimento, seus livros são traduzidos aqui pois foram originalmente publicados na França, onde ela reside há muitos anos.
Entre os autores estrangeiros, destacou-se o romance arturiano O gigante enterrado (The buried giant), do nipobritânico Kazuo Ishiguro, publicado pela Companhia das Letras. Ainda que parte de sua notoriedade tenha advindo da polêmica criada em torno de declarações pouco simpáticas do autor sobre o gênero da fantasia, o livro é excelente e merece a leitura. Quando a polêmica varreu as redes sociais, o multipremiado fantasista britânico Neil Gaiman foi um dos primeiros a sair em defesa de Ishiguro.

E Gaiman também apareceu de forma importante em 2015, com dois livros: A bela e a adormecida (The sleeper and the spindle, Rocco) e A verdade é uma caverna nas Montanhas Negras (The truth is a cave in the Black Mountains, Intrínseca).
Como a fantasia não dá sinal de enfraquecimento e os títulos à mão já foram todos publicados, as editoras partiram em busca de obras e autores esquecidos que, de outra forma, talvez nunca desembarcassem aqui. É o caso de Diana Wynne Jones (1934-2011), autora de grande prestígio no exterior mas pouco publicada aqui. A edição de O vitral encantado (Enchanted glass) pela Record é uma tímida tentativa em dar à autora de O castelo animado (Howl's moving castle) e Crestomanci (Chrestomanci) a atenção que lhe é devida. Outro nome importante lembrado em 2015 foi o escritor e ilustrador americano Dr. Seuss (1904-1991) com O desaparecimento do Lórax (The Lorax), pelo selo infantil da Companhia das Letras, um clássico do gênero. E também Chris Van Allsburg, com Jumanji, numa das derradeiras publicações da editora Cosac Naify, que anunciou no final do ano o encerramento de suas atividades. Vale ainda lembrar da publicação de Pequenos deuses (Small gods), do britânico Terry Pratchett (1948-2015), 13º volume da série Discworld, publicado pela Record no selo Bertrand Brasil.
Desde 2014, a ficção científica voltou a despertar interesse entre as editoras. A pequena Editora Draco, especializada no gênero, trouxe em 2015 alguns títulos que merecem a atenção, por autores historicamente ligados ao fandom: E de extermínio, de Cirilo Lemos, Encruzilhada, de Lúcio Manfredi, e Estranhos no paraíso, de Gerson Lodi-Ribeiro, enquanto Roberto de Sousa Causo apareceu com a coletânea Shiroma: Matadora ciborgue, pela Devir Livraria. Outro nome conhecido no fandom, há anos ausente da atividade autoral, é Henrique Flory que, pela Editora Arte e Ciência, publicou O elo, sequência de Projeto evolução, romance dos anos 1990 também republicado agora.
Ventania brava, de Luis Bras (Sesi-SP), junto à história alternativa A segunda pátria, de Miguel Sanches Neto (Intrínseca), formaram o núcleo da fc nacional que melhor dialogou com o mainstream em 2015. Mas o livro brasileiro de fc mais comentado no ano foi Le Chevalier e a Exposição Universal, de A. Z. Cordenonsi (Avec), romance steampunk que mistura ficção com personagens reais numa aventura à moda de Sherlock Holmes.
Entre os estrangeiros, é preciso antes de mais nada registrar a presença intensiva da coleção alemã Perry Rhodan da editora SSPG, que lançou regularmente cerca de seis volumes digitais por mês ao longo de todo o ano. Trata-se da série mais longa da literatura, com mais de dois mil livros e ainda em publicação.
O escritor americano Jeff Vandermeer retornou à série Comando Sul com Autoridade (Authority), pela editora Intrínseca, que explora possibilidades aterradoras advindas do contato com uma vida alienígena com a qual a comunicação não é uma possibilidade.
O último policial (The last policeman), do também americano Ben H. Winters, pela editora Rocco, aproxima a literatura policial da ficção científica ao contar a história de um homem obcecado em desvendar um assassinato nos dias finais da humanidade no planeta Terra, prestes a sofrer o impacto de um meteoro gigante. Trata-se do primeiro de uma trilogia, cujo segundo volume Cidade dos últimos dias (Countdown city, Philip K. Dick Award 2014) foi lançado pela mesma editora logo nos primeiros dias de 2016.
A editora Aleph, que investe principalmente na republicação de grandes clássicos da fc e tem como carro-chefe o escritor americano William Gibson – autor do prestigiado Neuromancer, que a editora tem republicado seguidamente desde sua primeira edição em 1991 –, dele traduziu História zero (Zero history), terceiro volume da série Blue ant que, por ser ambientada no presente, nem sempre é considerada ficção científica, mas segue os protocolos especulativos do cyberpunk para discutir o impacto psicossocial da tecnologia moderna.
Outro importante representante do cyberpunk que desembarcou por aqui em 2015 foi Ian McDonald com o romance Brasyl, pela editora Saída de Emergência Brasil, numa história que une três realidades, uma delas na cidade do Rio de Janeiro.
O horror é historicamente um gênero de produção estável e sustentou seu espaço em 2015. André Vianco, o maior bestseller da fc&f nacional, estreou o selo autoral Calíope na editora Giz, com o inédito romance Estrela da manhã. Também vale conferir a coletânea O vilarejo, de Rapahel Montes (Suma das Letras), que tem sido bem avaliada no ambiente mainstream.
Apesar de sua tradição e importância como nascedouro de talentos, as antologias tiveram um momento discreto em 2015. Contudo, vale destacar Vampiros, estreia da coleção Sobrenatural (Avec), organizada pelo escritor Duda Falcão com contos de importantes nomes do gênero como Giulia Moon, Carlos Patati, Nazareth Fonseca, Lord A. e Simone Saueressig, entre outros. Contudo, a grande novidade de 2015 no horror nacional foi a volta do mestre R. F. Lucchetti, com dois títulos: O museu dos horrores (Corvo) e O Escorpião Escarlate: O roteiro original (Laços).
Entre os estrangeiros destacou-se outro mestre, Stephen King, com nada menos que três livros publicados no ano: a coletânea Escuridão total sem estrelas (Full dark, no stars), e os romances Joyland e Revival, todos pela Suma das Letras, hoje selo da Companhia das Letras.
Outro mestre do gênero que apareceu em 2015 foi Clive Barker, com a novela original Hellraiser: Renascido do inferno (The hellbound heart), pela Darkside.
A dama do horror, Anne Rice, retornou ao universo de Entrevista com o vampiro (Interview with the vampire) no novo romance As crônicas vampirescas: Príncipe Lestat (Prince Lestat), pela Rocco. Até mesmo George R. R. Martin não resistiu aos encantos vampíricos e apareceu nas livrarias com Sonho febril (Fevre dream) pela LeYa Brasil. O romance é de 1982, mas só chegou agora devido ao sucesso de Martin com livros de fantasia medieval.
Finalmente, mas não menos importante, foi a publicação da coletânea Solomon Kane: A saga completa, de Robert E. Howard (1906-1936) pela editora Generale, reunindo os nove contos escritos por Howard para o destemido puritano caçador de bruxas.
Diante deste quadro, a conclusão é que não há do que se lamentar. A publicação de fc&f não parece estar vulnerável aos humores do mercado, prova que seu crescimento nos últimos anos não foi fruto de uma bolha; e a crise pode até ser benéfica para o setor, depurando o mercado dos evidentes excessos que em nada contribuem para o estabelecimento de uma fc&f sólida e relevante.
Ainda há muito que trilhar para tornar a ficção fantástica um espaço profissional ao exercício artístico, mas já é possível dizer, no que se refere aos aspectos conceituais, que a ficção fantástica brasileira está amadurecendo. Autores e editores que conseguirem superar a crise estarão prontos para assumir a liderança do mercado quando as coisas melhorarem.
Perseverar é, sem dúvida, a palavra de ordem para 2016.

Livros citados:
Dois mundos, um herói, Rezende Evil (Suma das Letras)
Filhos do Éden: Paraíso perdido, Eduardo Spohr (Verus)
Por um toque de ouro, Carolina Munhóz (Rocco)
O mundo das vozes silenciadas, Carolina Munhóz e Sophia Abrahão (Rocco)
Flores do jardim de Balaur, Carlos Orsi (Draco)
O legado folclórico: Ferro, água & escuridão, Felipe Castilho (Gutenberg)
Tijucamérica, José Trajano (Paralela)
Crônicas de Salicanda: A aliança, Pauline Alphen (Seguinte)
O gigante enterrado, Kazuo Ishiguro (Companhia das Letras)
A bela e a adormecida, Neil Gaiman (Rocco)
A verdade é uma caverna nas Montanhas Negras, Neil Gaiman (Intrínseca)
O vitral encantado, Diana Wynne Jones (Record)
O desaparecimento do Lórax, Dr. Seuss (Companhia das Letras)
Jumanji, Chris Van Allsburg (Cosac Naify)
Pequenos deuses, Terry Pratchett (Bertrand Brasil)
E de extermínio, Cirilo Lemos (Draco)
Encruzilhada, Lúcio Manfredi (Draco)
Estranhos no paraíso, Gerson Lodi-Ribeiro (Draco)
Shiroma: Matadora ciborgue, Roberto de Sousa Causo (Devir)
O elo, Henrique Flory (Arte e Ciência)
Ventania brava, Luis Bras (Sesi-SP)
A segunda pátria, Miguel Sanches Neto (Intrínseca)
Le Chevalier e a Exposição Universal, A. Z. Cordenonsi (Avec)
Perry Rhodan (SSPG)
Autoridade, Jeff Vandermeer (Intrínseca)
O último policial, Ben H. Winters (Rocco)
História zero, William Gibson (Aleph)
Brasyl, Ian McDonald (Saída de Emergência Brasil)
Estrela da manhã, André Vianco (Giz)
O vilarejo, Rapahel Montes (Suma das Letras)
Vampiros, Duda Falcão, org. (Avec)
O museu dos horrores, R. F. Lucchetti (Corvo) e
O Escorpião Escarlate: O roteiro original, R. F. Lucchetti (Laços).
Escuridão total sem estrelas, Stephen King (Suma das Letras)
Joyland, Stephen King (Suma das Letras)
Revival, Stephen King (Suma das Letras)
Hellraiser: Renascido do inferno, Clive Barker (Darkside)
As crônicas vampirescas: Príncipe Lestat, Anne Rice (Rocco)
Sonho febril, George R. R. Martin (LeYa Brasil)
Solomon Kane: A saga completa, Robert E. Howard (Generale)

domingo, 22 de novembro de 2015

A razão do universo

O jornalista e fotógrafo carioca Felix Richter, autor de Tem um louco solto na Amazônia (2009), O último urso polar (2011) e O conto azul de Leonardo Da Vinci (2012), acaba de publicar pela mesma editora Céu Azul de Copacabana o romance de fantasia A razão do universo.
A história narra a aventura de um homem de nossos dias que, sem aviso, vê-se transportado para uma realidade absurda num mundo mitológico onde tem que lutar para sobreviver, enfrentando uma série de desafios através dos quais será confrontado com as muitas dificuldades emocionais e espirituais que afetavam sua vida e seu casamento. O autor disponibiliza aqui os primeiros capítulos do livro para download gratuito.
O lançamento oficial acontece no próximo dia 8 de dezembro, a partir das 19h, na livraria Argumento (Rua Dias Ferreira, 417, Leblon, Rio de Janeiro).

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Mnemosine e os abomináveis homens de verde

O escritor paraibano Carmelo Ribeiro, autor dos romances A procura de Chã dos Esquecidos e Paxolino dos adoradores de Cristo nas terras da cafraria, já comentados por este blogue, acaba de lançar um novo livro. Trata-se de Menemosine e os abomináveis homens de verde, publicado pela editora Schoba, coletânea de 180 páginas com 14 contos de ficção especulativa inspirados na história do Brasil, muitos deles instalados no subgênero da história alternativa. E o autor tem mais do que talento literário – que já demonstrou nos seus livros anteriores – para tratar do gênero. Formado em História e mestre em Geografia, Carmelo Ribeiro brinca gostosamente com as amarras da academia quando diz, na orelha do livro: "A primeira lição do curso de história é: não existe 'se' em história. Mas como este não é um livro de história, o 'se' deu origem a muitos Brasis".
Alguns dos temas já são recorrentes no gênero, mas outros são ótimas novidades: o Brasil integralista, a volta de D. Pedro I ao Brasil, a vitória dos Balaios e Antonio Vinagre como governador de Belém, tudo embalado pela epígrafe inspirada de José Cândido de Carvalho: "As vezes penso que o Brasil não existe. É um conto de Pedro Álvares Cabral, com prefácio de Pero Vaz de Caminha".
Sem dúvida é um livro que vale a pena ser lido.

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Citizen Who

O que pode acontecer quando se reúnem o escritor Nelson de Oliveira e o ilustrador Teo Adorno? A resposta está em Citizen Who: Peripécias do famigerado Escritor Que Não Tem Boas Ideias, que acaba de ser publicado pela Editora Terracota.
Apresentado como "Um cordel bizarro. Edição de luxo", o livro – quase uma revista – tem 64 páginas fartamente ilustradas no estilo modernista de Adorno, com textos curtos, sem rima e sem métrica, mas que ainda assim remetem ao formato de cordel. Trata-se de uma obra claramente experimental, que brinca com a forma, o estilo e os temas abordados, que vão de Cidadão Kane a Doctor Who, como já se percebe no título, passando por Jorge Luiz Borges, A divina comédia e outras citações explícitas e implícitas. O livro ousa também no preço, que vem estampado na capa. Uma leitura divertida que recupera o trabalho de Nelson de Oliveira depois do prolongado auto exílio nas Bahamas. Pelo jeito, ele está mais a vontade com as influências populares, ser perder o estilo difícil de classificar. Na dúvida, vou dizer que é fantasia, mas quem não concordar estará coberto de razão.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

O gigante enterrado

O gigante enterrado (The buried giant), Kazuo Ishiguro. 396 páginas. Tradução de Sonia Moreira. Editora Companhia da Letras, São Paulo, 2015.

Há alguns meses, o fandom mundial de ficção fantástica agitou-se com as polêmicas declarações do escritor nipobritânico Kazuo Ishiguro a propósito do seu romance O gigante enterrado, uma história na tradição arturiana com inúmeros elementos de fantasia heróica medieval, rótulo que o autor fez questão de negar com comentários algo preconceituosos. Importantes autores do gênero reagiram às opiniões de Ishiguro, que moveu uma verdadeira campanha para contornar o mal estar criado pelo debate público. Ficou a suspeita de ter sido uma polêmica deliberada, pois o debate só fez aumentar o interesse pelo livro que a editora Companhia das Letras trouxe ao público brasileiro em 2014, com tradução de Sonia Moreira.
O que causou mais estranheza nas incômodas declarações de Ishiguro foi o fato dele já ter pelo menos um outro bestseller de gênero, a ficção científica Não me abandone jamais (Never let me go), uma história sobre clonagem de seres humanos já adaptada para o cinema. Menos mal, pois o debate ajudou a construir uma ponte, ainda que frágil, entre as muitas definições de fantasia que navegam nos ambientes do fandom e do mainstream.
O tenso bailado entre o mainstream e a ficção de gênero é recorrente não apenas na literatura, mas em todas as mídias. Trata-se do velho choque entre as artes erudita e a popular, que motivou mais de um paladino a propor manifestos e movimentos de resistência cultural, como por exemplo, o Movimento Armorial de Ariano Suassuna. Tanto é que, poucas semanas depois, a conhecida escritora infantojuvenil Ana Maria Machado fez declarações muito similares ao discurso de Ishiguro, com os mesmos resultados dentro do fandom brasileiro.
O gigante enterrado instala-se num momento imediatamente posterior a queda de rei Arthur. Contudo, apesar da ausência do soberano, a paz entre bretões e saxões continua, contrariando todas as expectativas em contrário. Os dois povos seguiam vivendo juntos e misturados, apesar das incontornáveis diferenças passadas que foram o maior problema ao longo do reinado de Arthur.
A história é contada a partir da vida do casal ancião Axl e Beatrice, que decidiu abandonar a comunidade na qual viviam para fazer uma visita ao filho, que morava numa aldeia distante. Mas algo não vai bem. A névoa que predomina a paisagem britânica parece ser a causa do peculiar comportamento das pessoas que, fácil e rapidamente, se esquecem das coisas. Não é diferente com o casal de anciãos, que também tem dificuldade de lembrar de seu passado e até da localização exata da aldeia em que mora o filho. Mesmo assim, lançam-se à aventura e sua jornada vai revelar não apenas a origem da estranha névoa do esquecimento, mas também os motivos que a trouxeram para um mundo à beira de se transformar para sempre. Ao longo do caminho, o casal vai se envolver com os protagonistas da dramática mudança que está por vir: o guerreiro saxão Wistan, cuja missão é matar a perigosa e traiçoeira dragoa Querig, o jovem estigmatizado Edwin, que foi mordido por um filhote de dragão e agora é protegido de Winstan, e um envelhecido Sir Gawain, último remanescente da prestigiosa Távola Redonda, que parece saber muito mais do que dá revelar. Ogros, fadas malignas, bruxas e outros seres mitológicos também vão surgir no longo e duro caminho de Axl e Beatrice. Apesar da evidente fragilidade física dos protagonistas, a história tem muita ação e violência, com uma conclusão dramática cheia de significados que certamente mudam conforme a percepção do leitor.
Japonês de nascimento, Ishiguro cresceu e foi educado na Inglaterra, para onde se mudou aos cinco anos de idade; sua literatura está, portanto, classificada como de língua inglesa. Contudo, podemos perceber influências da cultura japonesa em alguns momentos de O gigante enterrado, sobretudo nos duelos de espada, muito similares aos das histórias de samurais, nos quais tudo se resolve num único golpe.
Não há dúvida que O gigante enterrado é diferenciado do modelo de fantasia heróica que os leitores de nicho estão acostumados, não apenas pelo fato dos protagonistas serem idosos em contraposição aos adolescentes imberbes que infestam o gênero, mas por um conjunto de detalhes que vão de um estilo literário algo mais sofisticado, dos mecanismos narrativos, dos temas propostos à discussão e do final aberto e nada redentor. E, ainda que se possa perceber um pouco da famigerada "jornada do herói" no enredo, o autor o subverte em vários momentos, o que certamente o diferencia, mas não o suficiente para descaracterizá-lo como um romance de gênero como desejava o autor.
O gigante enterrado é uma leitura inteligente e acessível, embora um tanto perturbadora quanto as expectativas à fantasia heróica; é preciso estar disposto a rever alguns dos conceitos do gênero; um romance para o leitor que gosta de ser desafiado, portanto.

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Escuridão total sem estrelas, Stephen King

Escuridão total sem estrelas (Full dark, no stars), Stephen King. Tradução de Viviane Diniz. 390 páginas. Editora Objetiva, selo Suma das Letras, Rio de Janeiro, 2015.

A dúvida mais frequente entre o público leigo sobre o gênero do terror é se há alguma diferença entre "terror" e "horror". É provável que os dicionários considerem os dois termos como sinônimos e é isso mesmo. Contudo, os especialistas aproveitaram a diferença de grafia para definir "terror" como o nome do gênero de forma geral, que inclui todos os tipos de histórias que aterrorizam independente do agente do medo, enquanto que "horror" define especificamente aquelas cuja emoção emana de um vetor sobrenatural. Porque, é claro, existem muitas histórias em que o monstro não vem da mitologia, de outra dimensão ou de outro planeta: são pessoas normais, homens e mulheres que, como vemos todos os dias no noticiário policial, podem ser tão maldosos e degenerados quanto qualquer monstro de fantasia.
Dessa forma, seriam "de terror" as histórias de psicopatas, assassinos seriais, violência doméstica, perversões, tragédias fatais, canibalismo, etc, e como "de horror" as histórias de fantasmas, vampiros, lobisomens, alienígenas, zumbis etc que, geralmente, têm níveis de leitura mais ricos no campo metafórico.
Os livros assinados pelo escritor norte americano Stephen King são usualmente associados ao horror. E muitos deles são de fato vinculados ao sobrenatural. Contudo, King dá a todos eles um aspecto naturalista tão palpável que facilmente somos levados a questionar se estão efetivamente instalados nesse campo. Histórias como O iluminado (The shining), um de seus maiores sucessos, ficam na fronteira dessa definição, contemplando tanto a leitura fantástica quanto a naturalista, conforme a interpretação do leitor.
É o que acontece com as quatro histórias do autor que compõe a coletânea Escuridão total sem estrelas, publicada originalmente em 2010 nos EUA e traduzida em 2015 no Brasil pelo selo Suma das Letras da editora Objetiva. São histórias em que o maravilhoso se confunde com o psicológico e tudo o que parece sobrenatural pode ser apenas fruto da imaginação perturbada do protagonista.
A primeira história, "1922", é a mais longa e pesada do conjunto. Conta como uma família comum do meio-oeste americano, que sempre viveu mais ou menos bem, desmorona por quase nada, embora pareça quase tudo a princípio. Um fazendeiro, pressionado pela esposa que pretende vender as terras que herdou para morar na cidade grande, temeroso por perder suas próprias terras, planeja e executa, com a concordância do filho adolescente, o assassinato da mulher. Todos os cuidados que toma para não ser incriminado dão certo, mas ele não contava com a imaturidade do filho que engravida a namorada a quem ama profundamente e que, em tese, foi o argumento usado pelo pai para convencer o filho a ser seu cúmplice; e alguém que matou a própria mãe para não ser afastado de sua amada certamente não terá escrúpulos de passar por cima de qualquer outra dificuldade. O narrativa tem uma estrutura recorrente na obra do autor, como  visto por exemplo no conhecido romance O cemitério (Pet sematary), em que uma decisão equivocada do protagonista, ainda que decorrente de circunstâncias com as quais o leitor compactua, desencadeia uma série de eventos que, passo a passo, levam-no à perdição completa.
O segundo conto é "Gigante do volante", que tem um interessante viés metaliguístico. Autora de uma popular série de livros de detetive, ao retornar de uma palestra numa cidadezinha próxima de onde mora, é atacada e estuprada por um maníaco – o Gigante do Volante do título –  que acredita que a matou. Mas ela sobrevive e inicia uma cruzada de justiça para terminar de vez com a onda de violência que a vitimou. Mas, para isso, terá de se tornar ela mesma um monstro.
A seguir, encontramos o curioso "Extensão justa", um conto de humor negro que também aborda a questão da justiça. Um homem com câncer terminal encontra-se com um estranho vendedor ambulante que lhe oferece uma barganha com o que ele chama de "extensões" numa prosaica e bem pouco séria barraquinha de rua. No caso, o homem está interessado em estender sua vida um pouco mais, mas o vendedor exige, além de uma comissão de 10% de todos os seus ganhos futuros depositados uma vez ao ano numa conta no exterior, que indique alguém que irá receber o refluxo do mal que será tirado dele. Este aparenta ser o texto mais sobrenatural do livro mas, ainda aqui, podemos fazer uma leitura realista em que a aparição bizarra não seja real e esteja apenas na imaginação desesperada do personagem. Mas os resultados parecem indicar um pouco mais do que isso.
Fechando o volume, "Um bom casamento" conta como as coisas se encaminham entre um casal que tem o que parece ser um casamento perfeito há mais de 25 anos – financeiramente próspero e com filhos adultos e bem criados – quando a esposa encontra, por acidente, provas de que seu marido talvez seja um famigerado psicopata que assassinou diversas mulheres e crianças ao longo das últimas décadas.
Como acontece nos livros deste mestre do horror, os contos fazem inúmeras citações da cultura pop, como canções, livros, filmes de cinema e televisão, que cria um ambiente confiável e realista, e, em alguns casos, são fundamentais para se compreender o enredo. Nada está ali por acaso e, como nas mais elaboradas histórias de mistério, todo detalhe será aproveitado no final.
King diz no posfácio que este volume, ganhador dos prêmios Bram Stoker 2010 e British Fantasy 2011 de melhor coletânea: "Tentei dar o meu melhor em Escuridão total sem estrelas para mostrar o que as pessoas poderiam fazer, e como poderiam se comportar, sob certas circunstâncias terríveis", e é justamente esta a costura que alinhava estas quatro trabalhos tão diferentes entre si.
O que nos assusta de verdade em Escuridão total sem estrelas não é a violência e as mortes, sempre descritas com riqueza de detalhes dignas de uma imagem em alta definição, mas sim o fato de que, sob a mesma pressão, talvez nós também tenhamos talento para realizar coisas igualmente terríveis. O inferno não é o outro; está dentro de nós pronto para emergir: é só ter o motivo certo. Como diz King ao final de seu posfácio: "...acredito que a maioria das pessoas é essencialmente boa. Sei que eu sou. É quanto a você que não tenho tanta certeza". Touchê!

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Steampunk ladies

Steampunk ladies: Vingança a vapor, de Zé Wellington & Di Amorim, é um faroeste de ficção científica que conta como duas mulheres oprimidas movem uma ação de vingança contra um bando ciborgues foras-da-lei que dominam a sociedade.
Diz o texto de divulgação: "Como saquear uma locomotiva blindada considerada indestrutível? O que um dos maiores inventores do país tem a ver com isso? Tudo é parte do plano diabólico para o maior roubo de trem da história, orquestrado por Lady Delillah. Mas em seu caminho estão Sue e Rabiosa, mulheres que têm em comum destinos trágicos pela mão da criminosa. Para elas, mais difícil do que evitar este assalto é provar que duas damas podem ser as protagonistas de sua própria história no ambiente hostil do velho oeste."
Steampunk ladies é um lançamento da Editora Draco, tem 72 páginas coloridas e está em pré-venda aqui.

Feche os olhos, Lucy

É sempre bacana quando um autor que fez parte da história da fc no Brasil retoma a atividade literária. Da mesma forma com que, há algumas semanas, registramos a volta de Roberto Schima, comemoramos agora o retorno de Norton A. Coll, autor paulista muito ativo nos primeiros tempos da Segunda Onda da FCB, contumaz em quase todos os fanzines brasileiros do gênero ao longo dos anos 1980 e 1990. Coll retorna com a coletânea Feche os olhos, Lucy, em edição do autor, reunindo trabalhos inéditos com republicações de textos vistos em fanzines como Juvenatrix e Megalon.
A coletânea está disponível em formato real e ebook, e pode ser obtida com o autor através do email ncoll@hotmail.com.

domingo, 24 de maio de 2015

Outra América

A ficção especulativa, por motivos econômicos, especializou-se em uma miríade de gêneros e subgêneros devidamente esquematizados. Autores especializados em cada um desses subgêneros exploram cada uma de suas dobras em busca de seus limites sem perder os apelos comerciais que os editores exigem. Essa prática nos trouxe uma série de bons trabalhos criativos e perturbadores mas, por mais que se tente, sempre há uma fronteira que tem que ser respeitada, um protocolo que ali está para estabelecer a identidade da obra e seu público alvo. Eventualmente contudo, ocorre de um autor importante, mas não especializado, acidentalmente ou não, adentrar os domínios de um gênero como um touro enfurecido e, sem respeitar nenhum desses protocolos, ali instalar uma obra de tal forma autoral que a crítica tem dificuldade de classificá-lo. Há diversos exemplos dessa ordem, que causam intermináveis polêmicas entre os fãs, uns denunciam a invasão não autorizada, outros festejam que alguém importante finalmente tenha enxergado valor naquilo que tanto gostam, tudo isso enquanto o crítica mainstream destila seus preconceitos.
Por exemplo, temos os casos de 1984, de George Orwell, Shikasta, de Doris Lessing, A estrada (The road), de Cormac McCarthy, Associação Judaica de Polícia (The Yiddish Policemen's Union), de Michael Chabon, Não verás pais nenhum de Ignácio de Loyola Brandão, e Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago. A eles se soma também Complô contra a América (The plot against America) de Philip Roth, que recebeu uma nova edição em 2015 na coleção Companhia de Bolso, da Editora Companhia das Letras, com tradução de Paulo Henriques Britto.
É um caso curioso porque a obra de Philip Roth não apresenta nenhum outro livro especulativo. Sua produção está focada no realismo, em livros como O complexo de Portnoy (Portnoy's complaint) e Pastoral americana (American pastoral). Nascido em Newark, Nova Jersey, em 1933, Roth é um autor mainstream prestigiado, detentor dos mais importantes prêmios literários, entre os quais o Pulitzer e a National Medal of Arts. É um mistério os motivos que o levaram a escrever esta ficção especulativa instalada no subgênero da História Alternativa, um formato que geralmente faz sucesso apenas entre fãs de ficção científica.
Não se trata de uma ideia original. Antes de Roth, outros autores dedicaram textos à utopias nazistas na América, como, por exemplo, O homem do castelo alto (The man in the high castle), de Philip K. Dick, e O sonho de ferro (The iron dream), de Norman Spinrad, ambos já publicados no Brasil.
O caso é que Complô contra a América é muito mais que uma história alternativa. Trata-se de um romance em que o real e o imaginário misturam-se de tal forma que é praticamente impossível desassociá-los. Não porque seja difícil saber o que é historicamente correto ou não, porque essa percepção o autor providencia de modo muito claro, ao inserir, no final do livro, um apêndice detalhado com as biografias reais dos principais personagens históricos citados no romance, para "fornecer referências aos leitores interessados em saber até onde vão os fatos históricos e onde tem inicio a imaginação histórica", cita o próprio Roth na nota de esclarecimento que abre a seção.
O que não sabemos se é real ou não são os fatos ocorridos com os protagonistas, que nada mais são que os membros da família de Philip Roth, num relato que pode muito bem ser autobiográfico em sua maior parte, ou completamente inventado. Pois o romance, narrado em forma de um testemunhal, conta as impressões do infante Philip Roth que, com apenas sete anos de idade, vive um período turbulento da sociedade americana, exatamente os dias que antecederam a entrada do país na Segunda Guerra Mundial.
No romance, a comunidade judaica de Newark, onde vivem os Roth, é abalada quando, nas eleições de 1940, o herói da pátria Charles Lindberg – o primeiro homem a atravessar o oceano Atlântico sozinho num vôo sem escalas – elege-se presidente dos Estados Unidos derrotando o democrata Franklin Delano Roosevelt, que se candidatara ao terceiro mandato. Ocorre que Lindberg tinha ideias controversas, pois era antissemita assumido e admirador de Adolf Hitler. A presença de Lindberg na Casa Branca faz o país manter-se fora do conflito europeu e cria desconforto entre os judeus americanos ao abrir espaço à propagação do nazismo nos EUA.
O texto de Roth, ainda que dotado de menos maravilhamento que seus antecessores, ao importar o holocausto europeu para a América – numa situação que não aconteceu de fato –, apresenta um retrato um tanto cruel da sociedade judaica, discutindo agudamente a questão antissemita nos EUA, a estrutura familiar da comunidade, seus valores e cultura. Pelos olhos do pequeno Phil vamos acompanhar como o fascismo avança gulosamente sobre a sociedade americana, animada pela ampla aprovação à política isolacionista de Lindberg, travestida por ações pacifistas e progressistas. E a tragédia que era apenas um temor, comprova-se para a família Roth quando são tratados como cidadãos de segunda classe em uma malfadada viagem turística à capital do pais, assim como no drama do primo Alvin, que havia se alistado no exército canadense para lutar contra Hitler na Europa, mas retornou poucos meses depois sem uma das pernas, perdida em batalha.
O mais dramático, contudo, é que os traumas pelo que vão passar os Roth e seus vizinhos da comunidade judaica de Newark são, de forma geral, criados a partir da intolerância dos próprios judeus entre si, em especial a ação de Walter Winchell, radialista de enorme audiência que move uma campanha difamatória incansável – e não propriamente honesta – contra o presidente Lindberg. Em cada detalhe das recordações do pequeno Phil, as pistas de como os próprios judeus ajudam a construir as armadilhas para seus iguais, incluindo o próprio Philip que, do alto de seu inocente egoísmo juvenil, lança seu vizinho Seldon, provavelmente o único admirador que jamais teve, no pior de todos os infernos, potencializando a natureza de culpa que todo judeu carrega desde o berço.
O que enfraquece a tocante história de Complô contra a América é a atabalhoada explicação final, que sugere Lindberg como mais uma das vítimas de um plano nazista para dominar a América, sendo que tudo o que ele fez foi decorrente de chantagem, uma vez que os alemães teriam seu filho refém (na história oficial, o filho de Lindberg morreu ainda bebê, assassinado por um sequestrador psicopata). Ainda que a forma como Roth apresenta essa conspiração seja um tanto transversal, através de uma série de contraditórias reportagens de jornal que não parecem ser dignas de crédito, o efeito final é da História sendo reconduzida ao normal, apenas com um ano de atraso: os japoneses atacam Pearl Harbour em 1942 e os EUA acabam por entrar na Segunda Guerra ao lado dos aliados.
Mesmo assim, a opção de Roth por construir um holocausto pessoal pelos olhos de sua própria infância dá tal credibilidade á história que nos faz pensar que ela talvez tenha acontecido de uma forma ou outra, e que inacreditável é o fato de não ter sido assim, uma dúvida que perturbará para sempre o leitor: talvez, a história tenha sido mesmo aquela e sejamos nós que vivemos na realidade alternativa.
Cesar Silva

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Poderosa

O carioca Miguel Carqueija sempre foi conhecido no meio dos fãs de fc&f como um autor de grande produtividade: já nos anos 1980 e 1990, era frequente em todos os fanzines e publicações dedicadas ao gênero. Um conservador, como ele mesmo se define, tardou a entrar na internet e publicar seu primeiro ebook (As portas do magma, 2008, em parceria com Jorge Luiz Calife) mas, depois disso, tornou-se um dos autores mais ativos no segmento. Atualmente, não passa mais de três meses sem lançar um título, muitas vezes inédito, como é o caso de Poderosa, romance de fantasia urbana que o autor acaba de disponibilizar no saite Recanto das Letras.
Diz o descritivo da edição: "Elaine é uma menina pobre, de treze anos, moradora do Rio de Janeiro contemporâneo que descobre que dispõe de poderes especiais. Esses poderes, de natureza telecinética, a ajudarão a lidar com um namorado problemático e atrairão a atenção de dois bruxos de verdade".
A edição está disponível em formato de texto, com prefácio de Hortencia de Alencar e posfácio de Shirley Murphy.

terça-feira, 21 de abril de 2015

FC&F na Cia das Letras em 2015

A editora Companhia das Letras, agora unida a editora Objetiva, está com um catálogo cada vez mais recheado de títulos interessantes. A editora dispõe de uma razoável quantidade de lançamentos de 2015 que merecem a atenção dos leitores.
Para começar, a editora relançou, com nova capa e introdução de Neil Gaiman, o excelente Jonathan Strange & Mr. Norrel, de Susanna Clarke, romance de fantasia com traços explícitos de história alternativa, vencedor do Prêmio Hugo em 2005 e recentemente adaptado para a tv pela BBC (uma resenha detalhada pode ser lida aqui).
Também em seu próprio selo, aparecem Terra sonâmbula, do fantasista moçambicano Mia Couto e a monumental fc Graça infinita, de David Foster Wallace, autor novaiorquino desaparecido em 2008, ambos títulos importantes que devem fazer parte da lista de leitura de todos os interessados em literatura especulativa de qualidade.
Mas não é só e está longe de ser.
No selo Companhia de Bolso, a editora republicou recentemente o admirável Complô contra a América, de Philip Roth, um clássico da moderna ficção especulativa escrito por um dos mais prestigiosos autores americanos vivos.
Pelo selo Companhia das Letrinhas, dedicado a leitores mais jovens, aparecem as coletâneas Histórias indígenas dos tempos antigos, Pedro Cesarino, e O caixão rastejante e outras assombrações de família, de Angela-Lago, ambos autores brasileiros.
Pelo selo Seguinte, especializado em literatura para jovens-adultos, está disponível o romance de fantasia urbana A cidade murada, da escritora americana Ryan Graudin, com uma aventura eletrizante ao estilo New Weird numa estranha cidade inspirada num lugar em Hong Kong que realmente existiu.
O selo também apresenta novos volumes das séries Crônicas de Salicanda vol. 3: A aliança, da franco-brasileira Pauline Alphen; A seleção vol. 4: A herdeira, de Kiera Cass; Só perguntas erradas vol 3: Você não deveria estar na escola?, de Lemony Snicket; Infinity ring vol. 6: Atrás das linhas inimigas, de Jennifer A. Nielsen e Bloodlines vol. 5: Sombras prateadas, de Richelle Mead.
Já de posse dos títulos do selo Suma das Letras, a Companhia das Letras dispõe de dois novos títulos do mestre do horror Stephen King, a coletânea Escuridão total sem estrelas (vencedora dos prêmios Bram Stoker e British Fantasy) e a não-ficção Sobre a escrita: A arte em memórias, com um depoimento pessoal do autor sobre sua carreira e o ato de escrever.
Além disso, surgem também pelo mesmo selo a novelização Doctor Who: Mortalha da lamentação, de Tommy Donbavand, e o segundo volume da série de fantasia Os sete reinos: A rainha exilada, de Cinda Williams Chima.
Uma lista ampla, variada e respeitável, que merece ser observada.

Apagão

Finalmente, depois de uma espera de quase dois anos, está pronta a edição de Apagão: Cidade sem lei/luz, novela gráfica de ficção científica e horror criada pelo roteirista paulistano Raphael Fernandes, ilustrada perlo cartunista mineiro Camaleão e publicada pela Editora Draco, de São Paulo.
O projeto foi financiado através do sistema crowdfunding do Catarse, em que os interessados na sua viabilização contribuem antecipadamente em troca de reciprocidades oferecidas pelo produtor. Apagão arrecadou R$21 mil, quase o dobro do orçamento mínimo, mesmo assim, Fernandes afirma que a produção estourou o orçamento.
Diz o texto de divulgação: "Depois de um blecaute que parece não ter fim, as ruas de São Paulo viram um verdadeiro campo de batalha onde gangues de arruaceiros se enfrentam por território e recursos. Nessa cidade dominada pela lei do mais forte, o mestre de capoeira Apoema e seus Macacos Urbanos buscam reconstruir a sociedade e oferecer resistência à loucura que domina as ruínas da megalópole."
Há alguns meses, o autor distribuiu um arquivo pdf com o episódio bônus Apagão Extra: Ligação direta, também disponível em versão impressa.
O álbum terá dois lançamentos em São Paulo: dia 25 de abril, às 16h, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional (Alameda Santos, 2152, loja 122); e dia 2 de maio, às 15h, na Comix Book Shop, (Alameda Jaú, 1998).
Apagão: Cidade sem lei/luz tem 96 páginas coloridas, capa cartonada e preço de R$39,90. A versão digital será vendida por R$ 19,90.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Entre as nuvens

Segue a todo vapor o novo projeto do escritor e editor Ademir Pascale, a Fábrica de Ebooks, editora independente de livros virtuais que lançou vários títulos nas últimas semanas, principalmente de ficção fantástica.
O mais recente é a antologia Entre as nuvens, organizada pelo editor, com cinco contos de fantasia de Amauri Chicarelli, Edmar Souza Júnior, Dione Souto Rosa, Washington Luis Lanfredi e Misa Ferreira. O volume tem 28 páginas, está disponível nas versões epub e pdf, e pode ser baixado gratuitamente aqui.

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Última fortaleza: Semente de heróis

O escritor cearense Neil Armstrong lançou, no último dia 7 de abril, em Recife, o seu romance Última fortaleza: Semente de heróis. Planejado a princípio para ser um audiovisual, o projeto encontrou na literatura um caminho mais receptivo, no qual o autor pode trabalhar os conceitos desejados sem as limitações técnicas de uma obra audiovisual.
Diz a sinopse: "Um acidente de pesquisa leva um cientista e três de seus alunos a contactarem o futuro, cerca de cinco mil anos depois. Neste futuro, os últimos seres humanos do planeta tentam resistir na cidade que restou, dentro da gigantesca Fortaleza do futuro, a Última Fortaleza. No contato inicial, eles sofrem efeitos colaterais de tal forma que se não fizerem uma nova viagem programada e controlada, não só deixarão de existir, como poderão se tornar bombas humanas de poder indescritível. Ao chegarem ao futuro, terão seus corpos evoluídos e poderes potenciais aumentados, e poderão ser a única esperança dos últimos habitantes humanos do planeta."
O trabalho foi publicado pelo autor com auxílio do prêmio Edital de Incentivo as Artes, Literatura e Romance.

terça-feira, 31 de março de 2015

Andarilho das estrelas

Jean Pires de Azevedo Gonçalves informa que seu romance de ficção científica A saga de um andarilho pelas estrelas, está disponível em edição da editora Multifoco no selo Dimensões Ficção.
Diz o texto de divulgação: "Utopia pós-moderna, conta a história de um homem que abandona a Terra e viaja pelas estrelas, onde conhece civilizações extraordinárias. Mas o universo guarda infinitas surpresas e alguns planetas podem ser muito perigosos".
O texto foi composto em prosa mas também guarda trechos poéticos, na forma de oito sonetos.
O volume está disponível no saite da Multifoco, e também nas livrarias Cultura, Travessa e Cata Preço.

Fuligem: Terrores paulistas

O escritor e roteirista carioca Tiago Teixeira escolheu o cenário paulista para ambientar seu ebook de estreia, a coletânea Fuligem: Terrores paulistas publicada pela editora Time Machine. A maior cidade da América Latina é a personagem principal de seis contos de horror que mostram o lado mais sombrio dessa metrópole que nunca dorme. A capa do volume é assinada por Gabriel Silveira e um booktrailler pode ser visto aqui.
O livro está disponível na Amazon e Itunes.
Mais informações no saite do livro, aqui.

quarta-feira, 18 de março de 2015

As aventuras de Honey Bel

Está disponível para download gratuito a novela de ficção científica cômica As aventuras de Honey
Bel, de Miguel Carqueija, com a história de uma agente secreta que tem tudo para não dar certo. Diz o texto de divulgação: "Honey Bel é uma simpática, porém meio biruta, garota que vive na Terra II (um cometa terramorfizado) onde exerce a (para ela) difícil profissão de vendedora. Mas Honey quer ardentemente uma outra vida: aventuras e viver um amor intenso com o Príncipe Encantado. E ela quebrará lanças para conseguir o seu ideal."
A edição, em forma de arquivo de texto, chega através da página do autor no saite Recanto das Letras. O prefácio e o posfácio são respectivamente assinados por Francisco Martellini e Ricardo Guilherme dos Santos.