A ideia básica de uma antologia é a compilação de trabalhos previamente publicados, uma seleta de obras que se destacaram dentro de um segmento ou um tema. Quando as peças são de um mesmo autor, chamamos de coletânea.
No Brasil, tanto nas antologias como nas coletâneas predomina o material inédito. Isso porque faltam os periódicos nos quais os autores brasileiros se exercitem. Nos quadrinhos não é diferente, mas não foi sempre assim. Num passado recente, havia várias publicações nas bancas que traziam histórias de autores variados, como Animal, Canalha, Circo, Chiclete com Banana, Lúcifer, Porrada, Pau Brasil, Metal Pesado etc. Essa prática editorial garantiu o desenvolvimento de uma geração talentosa de artistas, entre os quais se destacou o André Toral que, em setembro último, lançou uma legítima coletânea, o álbum Curtas & Escabrosas, comentado aqui.
Trata-se da reunião de boa parte da produção curta de Toral: 23 histórias, que têm de duas a cinco páginas cada, muitas publicadas originalmente na revista Brasileiros.
São narrativas independentes com personagens diversos, todos brasileiros, passadas desde o descobrimento até os dias atuais. Contudo, dois personagens são recorrentes: Paulão, um motoqueiro que nunca tira o capacete, e o Carrasco da Moóca, um ex-boxeador que trabalha como leão de chácara em boates.
A maior parte das histórias é pintada com uma elegante técnica de aquarela — uma das paixões de Toral — enquanto outras são em preto em branco, da fase em que o artista desafiou-se a fazer quadrinhos "normais". Ainda bem que ele nunca conseguiu. As histórias de Toral têm o DNA dos grandes contistas: são poderosas, agudas e fazem um estrago enorme. O título do álbum é absolutamente perfeito.
Toral não publicou aqui suas histórias de guerra, que ainda aguardam uma oportunidade particular.
O talento desproporcional de Toral tem explicação genética. Paulistano, ele é filho do prestigiado artista plástico chileno Mário Toral e da acadêmica de história da arte Aracy A. Amaral. Desde criança, viveu rodeado pela arte. Contudo, sua primeira opção profissional foi a sociologia.
Graduado em Ciências Sociais pela USP, com Mestrado em Antropologia Social pela UFRJ, André Toral tornou-se antropólogo e trabalhou muitos anos como indigenista. Seu envolvimento com os quadrinhos começou justamente com as histórias curtas, no final dos anos 1980. Seu álbum de estréia foi O Negócio do Sertão: Como Descolar uma Grana no Século XVII (1992, Dealer), premiado com o HQ Mix. Outro grande momento do autor é o álbum Adeus Chamigo Brasileiro (1999, Companhia das Letras), também ganhador do Prêmio HQ Mix. Ainda é de sua autoria o álbum Os Brasileiros (2009, Conrad). Hoje com 53 anos, André Toral é professor de História da Arte na FAAP.
Curtas & Escabrosas tem 72 páginas em cores e é uma publicação da Livraria Devir. Altamente recomendável.
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