sexta-feira, 29 de maio de 2009

Solarium

Foi lançada há poucos dias a antologia de ficção científica Solarium, publicada pela editora "on demand" Multifoco sob o selo Antology.
Organizada pelo escritor pernambucano Frodo Oliveira, reúne contos de autores novos, muitos deles estreantes: André Gonzaga, Chico Anes, Danny Marks, Emanoel Ferreira, Gabriel Zigue, Hugo Vera, Humberto Amaral, José Geraldo Gouvêa, Larissa Redeker, Lino França Jr., Luiz R. R. Faria Jr., Magalhães Neto, Marcelo Andrades, Márcio Aragão, Marcus Vinicius da Silva, Nuno Lago, Pablo Casado, Ricardo Delfin, Ronaldo Luiza Sousa, Sabine Mendes e Victos Stéfano, além do próprio organizador, é claro. A maior parte dos trabalhos é bastante curta, sendo que o mais longo deles é "Atlantis", de Marcelo Andrades, um dos poucos que passa de 4000 palavras.
O livro tem 178 páginas e uma apresentação simples, tão econômica que nem traz uma apresentação que contextualize a sua proposta editorial. Ficamos, assim, dependendo da intuição sugerida pela ilustração e pelo brevíssimo texto da capa, que reproduzo a seguir:

"Bem vindo ao futuro. Este é o convite que a antologia Solarium faz aqueles que não têm medo de vislumbrar o que ainda está por vir. Cidades perdidas, seres de outros planetas, batalhas monumentais, galáxias distantes, tudo isso faz arte do inconsciente coletivo dos que, um dia, se apaixonaram pelo mundo fantástico da ficção científica. Convidamos você a desvendar conosco o grande mistério que é o futuro, este eterno desconhecido."

Dizia o escritor norte-americano Robert Heinlein que era fundamental que o primeiro capítulo de um livro fosse o melhor de todo o romance, que o primeiro parágrafo dele fosse o melhor de todos e a primeira frase desse parágrafo fosse tão boa que o leitor seria imediatamente fisgado e, dessa forma, iria irremediavelmente até o final da leitura. Por isso, uma das coisas que eu gosto de fazer quando pego um livro deste tipo é ler a primeira frase de cada um dos contos e ver qual deles me fisga de verdade. Geralmente o resultado não é muito animador - a maioria dos autores não liga muito para esse bom conselho do saudoso mestre - mas Solarium tem pelo menos uma ótima introdução, que quero compartilhar com vocês. Trata-se da primeira frase do conto "Os estranhos", de José Geraldo Golveia, que começa assim: "As silhuetas deles poluem agora a visão do horizonte." Realmente inspirador e tive de ler o conto inteiro na sequência.
Tenho a impressão que o livro foi uma edição cooperada, por isso recomendo, para quem quiser comprá-lo, que entre em contato com Larissa Redecker, que foi meu fornecedor neste caso. Mas acredito que cada um dos outros autores também deve ser um foco de distribuição da tiragem. Então, se você conhece algum deles, dê-lhes a preferência, é claro.

Volta Redonda tem inscrições abertas

O 22.o Salão de Humor de Volta Redonda vai distribuir este ano dez prêmios em dinheiro no valor total de R$24.000,00 para os classificados nas categorias de charge, cartum, caricatura, história em quadrinhos e a categoria temática "Crise Econômica".
As inscrições vão até o dia 15 de junho de 2009 e a exposição acontece de 2 de julho a 2 de agosto no espaço das Artes Zélia Arbex, em Volta Redonda/RJ.
Regulamento e informações aqui.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Prefácio para Farei meu destino, de Miguel Carqueija

A comunidade de autores de ficção científica no Brasil não tem o
costume de privilegiar a produção de histórias do gênero para os leitores jovens. Há um interesse predominante por se produzir para adultos, histórias violentas e repletas de referências que só um leitor com mais de 30 anos poderia perceber. Os enredos são herméticos, muitas vezes inseridos em séries cujos episódios anteriores são propriedade quase que exclusiva de grupos de interesse muito restritos.
Os editores também têm um comportamento elitista em relação ao que publicam quando se trata de ficção científica. Procuram por autores cultuados, com fama de pós-modernos, distantes do interesse e do alcance dos leitores jovens. Publicam pouco e mal, com tiragens pequenas, preço de capa altíssimo e distribuição tão deficiente que mal chega aos fãs mais ardorosos do gênero. É claro que esse tipo de política comercial também não colabora para que as histórias do gênero sejam acessíveis aos leitores que estão sendo apresentados à literatura.
Décadas dessa atitude criaram um mercado com um grande lapso de oferta de literatura de antecipação para jovens, que passaram a consumir ficção científica exclusivamente em outras mídias, principalmente a televisão e o cinema que, com filmes altamente digestivos, são um prato atraente para as mentes jovens famintas por aventuras fantásticas.
É aqui que se insere a obra do escritor carioca Miguel Carqueija, autor de ficção científica que, apesar de ter neste volume seu primeiro romance publicado profissionalmente, é veterano no gênero dentro do ambiente dos fãs de ficção científica – o conhecido fandom –, publicando em fanzines e revistas eletrônicas.
Miguel Carqueija está envolvido com a arte de escrever ficção fantástica desde os primeiros momentos do fandom, mais exatamente desde 1983, quando surgiu o já extinto fanzine Antares, editado em Porto Alegre pelo Clube de Ficção Científica Antares. Nesse e nos fanzines que vieram depois, tais como Megalon, Somnium, Juvenatrix, Notícias do Fim do Nada e outros, publicou uma enorme quantidade de trabalhos, principalmente ficção curta, mas também uma e outra novela, sempre de forma amadora e de distribuição restrita.
Como editor amador, apoiei o trabalho de Miguel Carqueija exatamente porque percebi nele essa dedicação aos leitores jovens. Além de vários contos publicados no meu fanzine Hiperespaço, publiquei três livrinhos de bolso com suas novelas de ficção científica: A âncora dos argonautas (1999), A Esfinge Negra (2003) e As luzes de Alice (2004), todas editadas pelo selo Hiperespaço. Recentemente, Carqueija teve publicada a novela O fantasma do apito (2007) pela Coleção Scarium Fantástica.
Mas Carqueija não passou todo esse tempo sem publicar profissionalmente. Participou da importante antologia Dinossauria Tropicália (GRD, 1994) e publicou em revistas como HorrorShow (Escala), Dragão Brasil (Trama), Magazine Perry Rhodan (SSPG) etc. Também é autor cativo nos luxuosos livros Banco de Talentos publicados pelo Banco do Brasil. O conto "O tesouro de Dona Mirtes", publicado num desses livros, chegou a ser transformado em curta-metragem.
Invariavelmente, Carqueija busca escrever histórias construtivas, que enalteçam qualidades humanas como a amizade, a honra, a compaixão e a esperança. Aprecia trabalhar com personagens com senso de humor e também faz lá suas referências, mas elas são geralmente de natureza infanto-juvenil, parte do universo de identidade dos leitores jovens.
Assim, Carqueija tem ultimamente buscado nos mangás e animês, produtos japoneses de grande aceitação entre os jovens de hoje, inspiração para seus trabalhos mais recentes. Este é o caso do romance agora publicado pela Giz Editorial, Farei meu destino, uma história de ação com a doçura comumente encontrada nas narrativas orientais. Segue também o urdume comum a essas histórias, reunindo um grupo de jovens que tem a missão de salvar uns aos outros de um mal aparentemente invencível.
Quando fiz a primeira leitura desse trabalho, sugeri ao autor alternativas para o destino dos jovens protagonistas, algumas das quais um tanto sinistras. É claro que, em sua sensibilidade autoral, Carqueija as rejeitou em função de uma solução mais adequada ao tipo de leitor que ele busca. E, sendo assim, aceito de muito boa vontade essas soluções.
A publicação de Farei meu destino é uma rara iniciativa da literatura de ficção científica brasileira em fazer ela mesma alguma coisa pragmática pela verdadeira renovação do corpo de leitores do gênero.
Farei meu destino não é um romance para adultos. Pelo menos não para aquele tipo de adulto que se esqueceu de que também é muito bom para a ficção científica ser positiva e construtiva, só para variar.
Farei meu destino foi publicado em 2008 pela Giz Editorial.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Futuro Proibido


Enfim, preenchendo um enorme lapso nas minhas leituras, conclui a antologia de ficção científica Futuro Proibido [Semiotext(e)] organizada por Rudy Rucker, Robert Anton Wilson e Peter Lamborn Wilson, publicada no Brasil em 2003 pela editora Conrad. A ideia dos organizadores era reunir textos ousados e perturbadores que eventualmente tivessem sido censurados em suas edições originais.
A editora brasileira comenta, na apresentação assinada por Marietta Baderna (!) que o livro seria publicado no Brasil em duas partes, anunciando para o segundo volume os trabalhos de Philip José Farmer e Robert Sheckley entre outros, no entanto publicou só o primeiro volume. Devido a essa "oportuna" decisão, ficamos com apenas parte desse curioso projeto.
Nesta edição, destacam-se os nomes de Bruce Sterling, Colin Wilson, Willian Gibson, Rudy Rucker e J. G. Ballard. A maior parte dos contos não foi realmente censurada. Publicados em fanzines, são textos algo libertinos para o estado da arte vigente a época em que foram escritos, mas lidos hoje soam praticamente normais. De fato, há trabalhos mais ousados entre os modernos escritores brasileiros de FC&F, mas é possível que muitos deles tenham sido influenciados pela leitura deste mesmo volume.
No aspecto erótico, os contos mais expressivos são "Êxtase no espaço", de Rudy Rucker - que não termina lá muito bem — e "O pênis Frankenstein", de Ernest Hogan — o mais entusiasmante do conjunto.
"Vemos as coisas de modo diferente", de Bruce Sterling e "Relatório sobre uma estação espacial não identificada", de Ballard, são textos bastante profissionais. O de Sterling lida com um tema algo sensível para os americanos, que é a presença em destaque de personagens árabes, mas ambos são trabalhos conservadores no estilo, ainda que avançados nas ideias.
A maior parte dos 16 contos publicados se destaca mais pela ousadia formal, pós-moderna, do que por seus conteúdos. O trabalho de Colin Wilson sequer chega a ser um conto, está mais para um artigo. Dentre esses textos alternativos, impressiona "Visite Port Watson!", de autor anônimo, que desenvolve-se em forma de um guia de viagem à uma ilha no meio do Pacífico que vai soar muito familiar a quem acompanha o seriado Lost.
Completa a edição alguns portfólios de artistas plásticos que perderam muito de seu possível apelo por serem publicados em uma apresentação pobre, sem cores e com definição ruim. Lamento, rapazes, não me entusiasmaram nem um pouquinho.
Por ser um livro pela metade, a sensação de incompletude é muito frustrante. Imaginar o que Farmer e Sheckley fizeram e que nunca saberemos é de deixar maluco. É difícil dar uma avaliação final realmente isenta, mas a sensação é que a ideia era melhor que o resultado. Poucos dos trabalhos publicados realmente cumprem a promessa do futuro proibido prometido pelo título nacional, mas vale a pena conhecer o que estes autores pensam ser uma FC imaginativa aos olhos do século XXI. Pelo menos a metade do livro é bastante inspiradora, o que é muito mais do que eu geralmente espero das antologias em geral.

Outras Copas em SBC


Como informei na semana passada, no dia 22 de maio compareci a um bate-papo para comentar sobre a minha participação na antologia Outras copas, outros mundos, publicada em 1998 pela Editora Ano-Luz, como parte de um ciclo de palestras sobre literatura e esportes promovido pela Biblioteca Manuel Bandeira, em São Bernardo do Campo. O organizador, Marcello Simão Branco, também compareceu e falamos para uma plateia de mais ou menos 70 pessoas, entre estudantes, professores e frequentadores da referida biblioteca.
A conversa começou com Marcello contando sobre o gênese do livro, como ele cultivou a ideia e finalmente organizou o material, ilustrando com referências sobre outros livros com o qual o Copas dialoga, bem como filmes que também tratam do tema. Por minha vez, expliquei de como surgiu a ideia do meu texto e como ele se desenvolveu até o ponto de tornar-se publicável. Também falei sobre os demais livros da Ano-Luz e sobre o Anuário Brasileiro de Literatura Fantástica.

Na mesa, Marcello Branco (esquerda) e Cesar Silva.

Depois de mais ou menos uma hora de palestra, convidamos o público a fazer perguntas, e foram muitas, sobre mercado editorial, sobre publicação amadora, sobre quadrinhos de futebol, sobre conteúdos pedagógicos e até sobre o motivo de não haver, no livro, um conto dedicado ao São Paulo Futebol Clube. De fato, apesar da maior parte dos contos dedicar-se às seleções nacionais, os únicos times citados nos contos são justamente os outros três grandes de São Paulo, Corinthians, Palmeiras e Santos. Marcello observou bem que, entre os 11 autores, há pelo menos quatro são-paulinos que não se interessaram, sabe-se lá por quê, em falar sobre seu time do coração. Dessa forma, fica aí uma dica para quem quiser reparar essa falha e escrever sobre as glórias do "Morum-tri" ou, por que não, sobre os demais times não lembrados nos 11 contos do livro.
O evento durou aproximadamente uma hora e meia e, ao final, ainda houve um lanchinho com torradas, patês, sucos e café para quem resistiu ao falatório.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Outras copas reboot


No dia 22 de maio, sexta-feira próxima, às 18 horas, participarei de um bate-papo programado pela Biblioteca Manuel Bandeira, em São Bernardo do Campo, sobre a minha participação na antologia Outras copas, outros mundos, um livro de contos fantásticos sobre futebol organizado por Marcello Simão Branco e publicado pela editora Ano-Luz em 1998.
A época, a Ano-Luz estava começando seus trabalhos e o livro respondia ao desejo de construir um catálogo significativo para a FC&F brasileira. Como o futebol é o esporte nacional e não havia nenhum livro do gênero sobre o assunto, estava claro que era uma ideia prá lá de oportuna. Principalmente porque estávamos às vésperas da Copa do Mundo da França, cheios de expectativa e esperança no pentacampeonato que, infelizmente, só viria quatro anos depois. A derrota na final contra a França, numa atuação suspeita e vexatória da seleção brasileira, realmente comprometeu a aceitação do produto naquela oportunidade. Mas a cada nova Copa, o livro volta à pauta e ganha visibilidade.
A Biblioteca Manuel Bandeira está ligada a um complexo poli-esportivo muito frequentado na região e programou uma série de eventos vinculando a literatura aos esportes; o fato de haver um exemplar do nosso livro no acervo foi determinante para o convite. O encontro foi noticiado na Agenda Cultural da cidade e foram distribuídas simpáticas filipetas, com a imagem acima, que deve atrair a atenção dos frequentadores do espaço.
Quem quiser aparecer, está obviamente convidado. A Biblioteca Manuel Bandeira fica na Rua Bauru, 21, Baeta Neves, São Bernardo do Campo, e a atividade rola a partir das 18 horas. A entrada é franca.

Paradigmas e Ficção de Polpa


Na sexta-feira da semana passada estive reunido com os meus editores, Richard Diegues e Gianpaolo Celli, proprietários da Tarja Editorial, e com o meu colega Marcello Simão Branco, para acertarmos os detalhes da publicação da edição 2008 do Anuário Brasileiro de Literatura Fantástica, que está em progresso, com possibilidades fortes de ser lançada durante a FantastiCon, em julho, na Biblioteca Viriato Correa, em São Paulo. A parte redacional foi concluída e revisada, a diagramação está pronta e estão sendo realizados apenas alguns ajustes técnicos para a a saída de gráfica. Em algumas semanas teremos uma prova da nova capa, que deve seguir o padrão da edição de 2007, porém com uma nova imagem.
Desta vez o Anuário vem com as resenhas dos livros Amor vampiro, Areia nos dentes, O caminho do poço das lágrimas, Fábulas do tempo e da eternidade, FCdoB – Ficção Científica Brasileira Panorama 2006/2007, Fome, O par: uma novela amazônica, A pulp fiction de Guimarães Rosa, Coisas frágeis, Nevasca, Tempo fechado, Esfinge e O homem que viu o disco voador, uma longa entrevista com o escritor André Vianco e um texto de Ramiro Giroldo sobre a obra de André Carneiro, além das listas de lançamentos, análises de mercado e todas as outras coisas que o leitor que acompanha o Anuário desde a sua primeira edição em 2005 já está acostumado.

No mesmo dia, aproveitei para prestigiar o lançamento do volume 2 da coleção de antologias Paradigmas organizada pelos editores da Tarja, com um apanhado de textos de ficção fantástica de diversos escritores brasileiros novos. Embora não tenha permanecido por muito tempo, adquiri meu exemplar, aproveitei o preço camarada (apenas R$13,00!) para comprar também o volume 1 que eu ainda não tinha, e cumprimentei alguns dos autores presentes, entre eles o meu amigo Ataíde Tartari, que eu não via há um bom tempo e não me canso de dizer que é um dos melhores escritores de FC&F do nosso meio. Pena que ele não exercite sua ficção com mais frequência, pois é um artista de mão cheia. Mas estou sendo um tanto injusto, uma vez que Tartari tem aparecido com alguma regularidade em antologias mainstream e está construindo uma reputação muito favorável.
Os volumes da coleção Paradigmas têm aparência gráfica inspiradora, que reporta aos experimentalismos de Dave McKean, cheia de detalhezinhos interessantes que atraem o olhar. Meus parabéns aos artistas que viabilizaram a publicação destes livros que, ombreados à coleção Ficção de Polpa – organizado por Samir Machado de Machado para a Não Editora –, sinalizam um renascimento dos periódicos de autores nacionais, agora num formato semiprofissonal que dá gosto ver. Ficção de Polpa também está num preço muito favorável, de forma que dá para comprar todos os volumes sem pesar no orçamento.

A propósito, o volume 3 de Ficção de Polpa, só com contos de fantasia, está à venda na Livraria Cultura da Avenida Paulista, onde também se podem encontrar os volume 1 – dedicado ao horror – e o volume 2 – dedicado à ficção científica. Com certeza, não temos do que reclamar em relação a o quê ler neste primeiro semestre de 2009.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Muito horror em e-zines gratuitos


Uma das atividades mais intensas dos fãs de FC&F tem sido a publicação de fanzines virtuais, os conhecidos e-zines. Especialmente nos últimos dois anos, muitos títulos surgiram e mesmo que uma parte tenha ficado só na primeira edição, outros lograram uma vida bem mais profícua, distribuindo novos números periodicamente.
Há e-zines de todos os gêneros mas os mais bem sucedidos são os dedicados ao horror, um gênero historicamente bem representado, com produtos regulares de mídia e fãs fiéis e ardorosos. Durante algum tempo, estive envolvido bem de perto com essa tribo e confirmei o grande interesse que eles demonstram por dinâmicas de grupo, como eventos e festivais. Certamente o mesmo ocorre com os fanzines.
Nos últimos dias, recebi nada menos que cinco fanzines de horror, todos distribuídos gratuitamente através da internet e quem quiser também pode consegui-los.

TerrorZine, editado por Ademir Pascale através do site Cranik, surgiu em 2008, e tem sido bastante regular. Dedicado à literatura, a edição 9 traz minicontos, dicas de livros e entrevistas com escritores, e mantém-se aberto aos colaboradores interessados em participar.

O mais veterano de todos, Juvenatrix, é editado por Renato
Rosatti, editor muito conhecido no meio, que mantém os atualizadíssimos blogs Infernotícias e Juvenatix, além do site Boca do Inferno. Juvenatrix teve uma longa vida em formato real, distribuído pelo correio para assinantes, mas a partir do número 109 tornou-se virtual, fundindo-se depois com o fanzine Astaroth, também publicado por Rosatti. O zine publica principalmente contos e artigos sobre cinema de horror, mas dá alguma entrada também para fantasia e ficção científica. Para consegui-lo é preciso solicitar ao editor, enviando um e-mail para renatorosatti@yahoo.com.br.

Adorável Noite, editado por Adriano Siqueira, é outro fanzine que teve edição real antes de se virtualizar, mas de certa forma sempre esteve ligado a atividade dos fãs na internet, através de listas de discussão e sites de autores, sendo o próprio Adriano um escritor bastante ativo, recentemente publicado na boa antologia de contos Amor Vampiro (2008) da editora Giz. O e-zine pode ser obtido no blog do autor, que também disponibiliza edições anteriores e e-books com trabalhos do editor, entre outras coisas bacaninhas.

Do site Ravens House chegaram os e-zines Flores do lado de cima nº6, dedicado a literatura e cinema, e Fun House nº8, dedicado a histórias em quadrinhos e rock. Além de artigos e dicas em suas especialidades, os dois fanzines divulgam a cobertura da Fantástica Jornada Noite Adentro, evento de horror realizado dia 13 de março na biblioteca pública Viriato Correa, em
São Paulo, capital, com as presenças ilustres do escritor André Vianco e a atriz performática Liz Vamp.

Todos estes e-zines são publicações amadoras, feitas por diletantismo de seus editores, por isso o resultado é vigoroso e pode causar brotoejas em quem está desacostumado. Mas com doses regulares, as brotoejas desaparecem e a coisa fica bem divertida.

Ainda sobre horror, o escritor Mario Carneiro Jr. está organizando um concurso de contos promovido nas comunidades Escritores de Terror e Histórias de Terror, e outras comunidades, blogs, sites etc. O regulamento pode ser lido aqui e aqui. Mario adiantou que pretende fazer algo memorável e relevante, por isso está convidado escritores importantes e bem posicionados no meio. Os prêmios serão livros que ele está reunindo através da doação de escritores e editoras. Participe!

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Anuário no HQ&Cia


No dia 4 de abril estive no estúdio da AllTV, acompanhado do jornalista Marcello Simão Branco, para a transmissão de um dos programas da emissora, o divertido HQ&Cia , comandado pelo jornalista César Freitas e dirigido por Edu Fernandez. O tema da nossa participação foi o Anuário Brasileiro de Literatura Fantástica, cuja edição referente a 2007 foi publicada em outubro de 2008 pela Editora Tarja.
A AllTV é uma emissora digital cujo sinal só pode ser captado pela internet, e o HQ&Cia vai ao ar, ao vivo, todos os sábados às 15 horas. No site do programa podem ser acessadas muitas entrevistas com personalidades ligadas ao mundo do entretenimento, entre escritores, editores, quadrinhistas, fãs e muito mais, basta acionar os links correspondentes. Recomendo, para os interessados em literatura fantástica, a ótima participação da brasilianista Lybby Ginway, acadêmica norte-americana especialista em ficção científica brasileira, entrevistada pelo programa em 2007.
Chegamos lá cerca de 15 minutos antes do nosso horário e pudemos ver o final da gravação do programa anterior, uma movimentada mesa com artistas da luta-livre, que mesclava falas dos participantes com cenas clássicas dos saudosos programas de telecatch da TV brasileira. E depois da gente, veio um programa muito bacana sobre seriados de TV que eu fiquei muito interessado em assistir.
Na nossa vez, falamos sobre um bocado de coisas ligadas a FC&F e acabamos tocando só de leve no assunto principal – o Anuário. Tudo bem, porque a conversa ficou mais leve e abrangente.
Não vou falar mais nada sobre a nossa participação porque ela pode ser vista na íntegra aqui. O estúdio teve problemas em um dos microfones da mesa - justamente aquele que deveria pegar as nossas vozes - por isso perdoem o volume baixo das nossas falas.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

O senhor da chuva, André Vianco

Investi alguns dias deste ano na leitura dos livros de André Vianco, escritor de Osasco que tem aparecido muito bem nas livrarias, pela Editora Novo Século. Seu livro de estreia, o romance vampiresco Os sete, publicado há coisa de dez anos, foi muito bem recebido pelos leitores e inaugurou uma nova era no acesso dos autores de FC&F às editoras brasileiras.
Apesar do sucesso, o autor é um camarada muito simples e simpático, que não se furta a comparecer aos eventos sobre horror organizados pelos fãs. Há poucas semanas ele cedeu uma longa entrevista ao Anuário Brasileiro de Arte Fantástica, entrevista esta que vai ser publicada na edição deste ano. Pretendia ler alguns livros para me preparar para a entrevista, mas acabei me entusiasmando com o autor e já li quatro títulos, que comentarei aqui nos próximos dias.
Agora vou falar do último que li, O senhor da chuva (Novo Século, 2001) que na verdade foi o primeiro que o autor escreveu. Conforme confessou na entrevista dada ao Anuário, Vianco não gosta muito desse livro porque o considera muito amador, mas ainda assim não pretende reescrevê-lo. De fato, o romance apresenta algumas inconsistências, mas nada que destoe exageradamente. É um livro que entretém, tem bons personagens – uma característica em todos os livros de Viancoótima narrativa e até meritórios objetivos filosóficos.
A história é sobre dois irmãos gêmeos separados pela vida. Samuel tornou-se fazendeiro e toca uma plantação de milho na imaginária cidade de Belo Verde, no interior de São Paulo, enquanto o outro, Gregório, caiu no mundo e se tornou um pequeno traficante de drogas na capital do estado. Gregório pretende voltar para sua antiga vida em Belo Verde tão logo encerre seu último grande negócio, que lhe irá render muito dinheiro. Mas as coisas não dão certo e ele acaba fuzilado pela gangue que ia lhe comprar a droga.
Neste ponto insere-se o maravilhoso, quando Thal, um anjo da guarda que toma conta de algumas boas almas da região, tocado pelos sentimentos sinceros do traficante, tenta interferir na tragédia e acaba vitimado por uma horda de demônios que acompanhava a gangue assassina. No momento da morte de ambos, um milagre acontece e o espírito combalido do anjo entra no corpo físico de Gregório, devolvendo-lhe a vida ao mesmo tempo que o arremessa ao local em que ele mais pretendia estar, Belo Verde. Encontrado no meio da plantação de milho do irmão, um desmemoriado Gregório acredita que poderá viver tranquilamente dali em diante, mas as hostes demoníacas farejam o destino do anjo Thal que agora habita o seu corpo, enquanto velhos inimigos de Gregório, que também querem sua pele, encaminham-se à pequena cidade, onde se prenuncia um holocausto de proporções cósmicas, cujo desfecho trágico e previsível só poderia ser evitado pela intervenção divina.
O senhor da chuva tem, portanto, um enredo movimentado, com muita ação, tiroteio, batalhas violentas e sanguinárias em dimensões que se superpõe (homens x homens; anjos x demônios), interferindo uma na outra através do vínculo entre Gregório e Thal. Além dos anjos e dos demônios, outros seres sobrenaturais aparecem no livro, que por exemplo não deixa de dar sua própria versão para os objetos voadores não identificados.
O que mais surpreende em O senhor da chuva é a coragem do autor em usar a doutrina cristã na composição da cosmologia do romance, num momento em que o niilismo ateu predomina os discursos literários. Explica-se: André Vianco passou sua juventude na igreja Batista, e tem uma forte formação religiosa. O senhor da chuva reveste-se, portanto, de um caráter evangélico explícito, ainda que um tanto permissivo, derivando em alguns momentos para o gnosticismo e até o espiritismo kardecista. Não deixa de ser, contudo, um exemplo raro desse tipo de ambiente na literatura fantástica, principalmente no Brasil, abrindo um leque de possibilidades novas ao gênero. Também é muito louvável o fato do autor não ter evitado expôr essa visão, perfeitamente autêntica dentro de suas convicções pessoais.
E ninguém poderá dizer que não fez bonito. Ainda que não seja seu maior sucesso, O senhor da chuva emplacou várias tiragens (o meu exemplar, de 2007, é a 11ª reimpressão) e continua a ser bem vendido nas livrarias brasileiras. Recomendo.