quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Resenha do Almanaque: Incidente no Caribe, Denise Reis

Incidente no Caribe, Denise Reis. Prefácio de André Valente. 128 páginas. Rio de Janeiro: da autora, 2005.

Incidente no Caribe, de Denise Reis, é uma novela que se insere no tema da transmigração de um personagem contemporâneo para uma utopia tecnológica, uma tradição desde a proto-ficção científica que caracteriza boa parte dos primeiros exemplos da literatura do gênero e, principalmente, aquela feita no Brasil. Porém, Incidente no Caribe não é exatamente uma obra de ficção científica, mas uma fantasia esotérica.
Dr. Renato Di Cosmo é um renomado físico brasileiro em férias no Caribe. Ele mergulha sozinho no mar da Ilha de Bimíni e ali encontra submersas ruínas de uma construção antiga em ouro e cristal. No mesmo instante, é arremessado para uma outra realidade, na qual emerge nu e desorientado numa praia deserta com duas luas no céu. Depois dos primeiros momentos de pânico, começa a explorar a região e localiza água e alimento mais que suficientes para manter-se vivo.
Muito tempo depois, Renato encontra uma aldeia vivendo uma utopia de conforto e fartura. São cidadãos de Aztlan, uma grande metrópole insular que está em guerra contra um inimigo distante. Em breve, seus dirigentes vão acionar a arma suprema, recentemente desenvolvida, que derrotará para sempre todos os seus inimigos. Porém, Renato é alertado por um sábio resignado que alienígenas amistosos previram que o disparo dessa arma vai também arrasar o planeta e destruir a humanidade. Eles têm um plano de evacuação em suas espaçonaves para uns poucos escolhidos, mas o nome de Renato não está nessa lista. Sua única esperança de sobrevivência é encontrar o portal que o trouxe até ali e fazer o caminho inverso, retornando ao seu próprio tempo antes da catástrofe.
Este é o resumo da novela que parece ter sido o primeiro e único trabalho de Denise Reis no gênero. Nas orelhas da capa do volume descobrimos que a autora é engenheira, jornalista e ex-sócia da Editora Leviatã, do Rio de Janeiro.
Denise Reis tem um texto leve que se lê com facilidade, não utiliza vocabulário rebuscado nem pratica exercícios formais intrincados, narrando a história com simplicidade, o que é ótimo para qualquer tipo de literatura e muito desejável para atingir o público jovem. Um bom caminho para qualquer autor dar sequência ao seu trabalho literário mas que, infelizmente, parece não ter encontrado sequência neste caso. 
O prefácio é assinado pelo linguista André Valente, que comete uma gafe logo nas primeiras linhas, quando diz: "A autora extrapola os limites do romance de ficção científica e nos oferece um texto profundamente humanístico".  Não era necessário que, para elogiar a autora, o prefaciador tivesse que desqualificar o gênero em que a obra se insere. Fica patente o preconceito ao sugerir que só extrapolando as fronteiras da ficção científica uma obra possa atingir o humanismo. 
Ainda bem que a autora não compartilhou desse preconceito ao fazer constar "Ficção Científica" na capa do volume. Ponto para ela. 

quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Relançamentro: O inverno do vampiro

Esta em pré-venda o romance de horror O inverno do vampiro, do escritor portoalegrense Júlio Ricardo da Rosa, pela editora Avec.  
Diz o texto de divulgação: "Início dos anos 60, Porto Alegre. Durante um inverno dos mais rigorosos, um homem, recém-chegado à cidade, é atacado por criaturas que se nutrem de sangue humano. Junto com seu excêntrico senhorio e um médico, enfrentam esta ameaça pelas ruas de uma cidade que recebe as primeiras imagens de televisão, em que bondes circulam até a meia-noite e os cinemas dominam o imaginário dos seus habitantes. Os códigos para enfrentar estes seres encontram-se em um diário que narra acontecimentos passados em 1941, durante a grande enchente, e a maldição que se estendeu sobre um sacerdote. A batalha final se dará nas ruas e no silêncio de um prédio que esconde uma terrível ameaça".
O volume tem 144 páginas e é uma reedição do trabalho galardoado com o Prêmio Odisseia de Literatura Fantástica 2020, originalmente publicado em 2019 com recursos do próprio autor. 
O inverno do vampiro pode ser adquirido no saite da Avec, aqui.

terça-feira, 28 de novembro de 2023

Juvenatrix 252

Está circulando a edição de novembro do fanzine eletrônico de horror e ficção científica Juvenatrix, editado por Renato Rosatti. 
Em quatorze páginas, traz conto de Caio Alexandre Bezarias, resenhas do editor aos filmes Monstrosity (1963), Monster from Green Hell (1957) e a clássica série de tv O elo perdido (Land of the lost, 1974/1976), além de uma hq de Angelo Júnior, que também assina a ilustração da capa.
A edição é completada com notícias e divulgação de publicações alternativas e bandas de metal extremo.
Cópias em formato pdf podem ser obtidas pelo email renatorosatti@yahoo.com.br.

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Lançamento: Os fantasmas entre nós, Gih Alves

"Na Universidade Agnes Dantas, os estudantes aprendem com o paranormal. Embora seja admirada em todo o país, a instituição só não tem uma reputação perfeita porque, todo ano, pelo menos dois alunos morrem em suas instalações sob circunstâncias suspeitas. Para Manuela e Isadora, as provas, a vida longe da família e os sentimentos confusos que uma tem pela outra já são problemas suficientes para ocupar a cabeça. Até que, depois de serem atacadas por uma fantasma loira em um banheiro da universidade, elas se dão conta de que podem ser as próximas vítimas dessa trama e, ao tentarem desvendar esse mistério, vão perceber que há mais fantasmas entre elas do que imaginavam."
O texto acima apresenta aos leitores a trama de Os fantasmas entre nós, romance de estreia da escritora gaúcha Gih Alves, que trafega livremente entre a fantasia, o horror e, porque não dizer, também a ficção científica, sendo um ótimo exemplo da New Weird praticada no país. Afinal, a fantasmagoria que Gih Alves utiliza em seu universo tem fundamentos cosmológicos e cientificistas, dialogando de maneira muito próxima com o interessante seriado de tv Lockwood & Co., com um toque a mais de romance.
O livro, que tem 273 páginas e é uma publicação do selo Seguinte da editora Companhia das Letras, já disponível nas livrarias.

sábado, 25 de novembro de 2023

Bang! 34

Bang!
é um periódico português editado por Luís Corte Real para a Editora Saída de Emergência, uma das melhores publicações lusófonas dedicadas ao fantástico. 
A edição 34, publicada em novembro de 2023, tem 84 páginas profusamente ilustradas com artigos sobre literatura, cinema, música, jogos de tabuleiro e resenhas assinados por António Monteiro, João Ruy, Adelino Cunha, Guilherme Pimenta, Tiago Manuel da Hora, Marcelo Lourenço, Cláudia Araújo Teixeira, Bruno Martins Soares, Célia Almeida Nogueira, Jorge Palinhos, Joana Caetano, Fernando Ribeiro e António Sousa Lara. 
Destaques para os romances Windhaven, de George R. R. Martin  e Lisa Tuttle, em artigo assinado pelo pesquisador brasileiro Bruno Anselmi Matangrano; Oceânia, da escritora portuguesa Lucy Angel, com excerto e entrevista com a autora; Quando o Vaticano caiu, do português Pedro Catalão Moura, também com trecho e entrevista com o autor; e os contos "A escolha", da "best seller" americana Nora Roberts, e "Lyra", da fotógrafa e maquiadora portuguesa Mara D’Eleán: o conto ilustra um singular ensaio fotográfico com a própria escritora como modelo.
A versão impressa da Bang! é distribuida gratuitamente apenas nas livrarias Fnac em Portugal, mas os brasileiros têm acesso gratuito a todo o seu conteúdo em versão digital, aqui. Edições anteriores também estão disponíveis.

sexta-feira, 24 de novembro de 2023

Resenha do Almanaque: A cidade invisível, José Ronaldo Viega Alves

A cidade invisível, José Ronaldo Viega Alves. 58 páginas. Porto Alegre: Opção2, 2006.

A cidade invisível é uma coletânea de crônicas inspiradas na história, nas paisagens e nos personagens da cidade de Sant´Ana do Livramento, onde Viega Alves reside desde o nascimento.
Crônicas são peças raras na produção de ficção fantástica brasileira e é surpreendente a quantidade de boas ideias que o autor encontra em seus devaneios, muitas delas perfeitamente funcionais em qualquer outra cidade do Brasil ou do mundo. São trinta textos, todos entre 50 e 250 palavras, cada um discorrendo sobre um aspecto da cidade e do valor que imprimiu no imaginário do autor.
Algumas dessas crônicas também tratam do fascínio que Viega Alves nutre pelo cinema, seja pelos filmes como pelas salas exibidoras e as pessoas por detrás delas, tanto das películas quanto as que trabalham nas salas de cinema.
A edição artesanal é simples, mas revela muito carinho por parte do editor.
Um trabalho necessário num ambiente que, ao optar pela prosa mais convencional da pulp age, ignora formatos literários igualmente legítimos, como a poesia e a crônica que podem ser vistas aqui.

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Barbárie Fantástica 2

Está circulando o segundo número da revista Barbárie Fantástica, editada por Jean Gabriel Álamo, inteiramente dedicada à aventura de fantasia, mais conhecida como Espada e Feitiçaria. A revista é uma publicação do selo FantasticHub em uma parceria entre as publicações Literatura Fantástica, Fórum Conan e Explorando Segredos e Mistérios.
Diz o texto de divulgação: "Viaje para a antiga Lemúria a fim de tentar evitar uma guerra, recupere um artefato poderoso pertencente a um grupo de cultistas, escolte a população de um vilarejo em fuga que vem sendo atacado continuamente por bandoleiros, explore uma exótica cidade nos confins do mundo cuja população guarda uma profunda relação de veneração a serpentes, viaje à Alta Idade-Média e testemunhe os conflitos dos povos nórdicos com os cristãos, acompanhe uma trama recheada de conspirações e seduções entre deuses romanos, lute contra um poderoso feiticeiro capaz de destruir a sua sanidade, escape com Conan de seu cativeiro e enfrente um grupo de cultistas que pode trazer ao mundo horrores além da compreensão".
A revista tem 326 páginas e traz artigos de Robilam C. Jr., Ricardo Quartim, Alexandre Callari, 'Muramasa', Fábio Ochôa e Domenico Gay, contos de Naôr Williams, Ricardo José Dunder, Oghan N'Thanda, Eduardo Kasse, Tony V. Lopes, Gabriel Madalena, Marco Antonio Collares e do editor, e quadrinhos de Rafael Barbosa e Theo de Mello.
A revista é publicada unicamente em formato digital e pode ser adquirida aqui.

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

Resenha do Almanaque: Natureza móbile, José Ronaldo Viega Alves

Natureza móbile
, José Ronaldo Viega Alves. 54 páginas. Ilustrações de José Ronaldo e Arthur Filho. Porto Alegre: Opção 2, 2006.

Natureza móbile é uma coletânea poética do escritor gaúcho José Ronaldo Viega Alves, publicada em 2006 pela editora portoalegrense Opção 2, num acabamento artesanal simples e intimista.
Traz 28 poemas curtos, construções concretistas e haikais. Este formato já garante, por si, uma variação importante aos trabalhos de ficção fantástica publicados no Brasil, em que predomina a prosa. Mas não é apenas o aspecto formal que destaca Viega Alves, mas a sutileza que ele demonstra ao observar os detalhes do cotidiano à luz do maravilhamento próprio de quem aprendeu a se emocionar com as batalhas espaciais das histórias de ficção científica.
As poesias não são todas classificáveis como fantásticas, mas o conceito que as sustenta é muito identificado com aquele que se percebe nas histórias de fc&f. Como, por exemplo, neste pequeno poema chamado “Viajantes no tempo”: Quantos desses seres humanos / Com quem cruzamos / nas ruas diariamente / vivem no presente? Ou nesta frase, retirada de “O livro das 1001 perguntas”: Máquina do tempo enferruja?
Assim, de surpresa em surpresa, Viega Alves nos presenta em Natueza móbile sua visão de um mundo que mostra o maravilhoso no cotidiano.
O volume se une a outros títulos do autor, formando um mosaico multicolorido de impressões emocionantes de se contemplar.

terça-feira, 21 de novembro de 2023

Resenha do Almanaque: A mão que cria, Octávio Aragão

A mão que cria
, Octavio Aragão. 160 páginas. São Paulo: Mercuryo, selo Unicórnio Azul, 2006.

A mão que cria é o romance de estreia do escritor carioca Octavio Aragão, até então conhecido no ambiente restrito do fandom brasileiro por fundar e dirigir o projeto multimídia Intempol, um universo compartilhado por vários autores. Antes de A mão que cria, Aragão publicou cerca de meia dúzia de contos, de bons a muito bons, em fanzines e antologias. Quem acompanhou sua trajetória, recebeu o romance com uma expectativa positiva. Finalmente, uma editora de porte apresentava um livro inédito assumidamente de fc&f de autor brasileiro. Isso porque a editora Mercuryo, que já teve em seu catálogo best-sellers como a série Operação Cavalo de Troia, de J. J. Benitez, já havia flertado com a literatura fantástica quando publicou coleções extensas de novelizações de X- Files e Star trek, além da breve coleção de banca Conan: Espada e magia, com contos de Robert E. Howard, L. Sprague de Camp e Lyn Carter.
A mão que cria é arrojado na temática – não muito habitual na literatura brasileira – conhecida como ficção alternativa. Esse tipo de história constrói seus enredos utilizando personagens de outros autores, geralmente muito conhecidos e, preferencialmente, em domínio público. Muitos escritores importantes da fc&f internacional já usaram esse expediente, entre os quais o americano Philip José Farmer em The other log of Phileas Fogg, no qual reconta A volta ao mundo em 80 dias, de Júlio Verne, e o britânico Brian Aldiss em Frankenstein unbound, uma espécie de continuação delirante ao clássico de Mary Shelley.
O prefácio, assinado por Gerson Lodi-Ribeiro, conta rapidamente a história da ficção alternativa e sugere que este romance de Aragão seria o precursor do gênero no país. Passou perto. Alguns anos antes, mais exatamente em 1995, José J. Veiga e Jô Soares apropriaram-se do Sherlock Holmes de Arthur Conan Doyle em seus respectivos romances O relógio Belisário e O xangô de Baker Street. Contudo, A mão que cria não tem a mesma proposta daqueles autores. Enquanto Veiga e Soares tinham em mente a produção de uma obra original, com um toque sutil de ficção alternativa, Aragão mergulhou completamente na apropriação de personagens alheios: praticamente não há um único personagem original em toda a trama.
Em A mão que cria, o panorama mundial, especialmente o europeu, foi alterado para abrigar diversos personagens reais e literários emprestados de Júlio Verne e H. G. Wells. O próprio escritor francês torna-se ainda mais importante na medida em que, nos primórdios do século XX, é eleito presidente da França. Usando sua influência, Verne recruta todos os cientistas malucos que seu país pode pagar e lá instala o centro do mundo. O exercício de reconstrução histórica é minucioso e exaustivo, sendo o grande mérito do autor no trabalho.
Nesse ambiente, enfrentam-se dois antagonistas. Um deles, chamado Ariano, é uma versão livre do Caveira Vermelha, vilão das histórias em quadrinhos do Capitão América. Tão livre, aliás, que por muito tempo tive a impressão de que se tratava do monstro de Frankenstein. O outro é Lours, uma espécie de humano híbrido com golfinho, também inspirado em uma personagem das histórias em quadrinhos, possivelmente Aquaman ou Namor.
Gigantes entre os homens, Ariano e Lours competem pela liderança do mundo, apoiados por novas espécies inteligentes sobre a Terra: Ariano encontrou no meteoro caído em Tunguska em 1908, o elemento que precisava para criar sua própria raça de seguidores, os desmortos (inspirados nos zumbis do filme A noite dos mortos-vivos de George Romero), enquanto Lours comanda toda uma população de híbridos alterados geneticamente, como ele mesmo, a partir dos estudos de um certo Dr. Moreau (emprestado de A ilha do Dr. Moreau, de H. G. Wells).
O conflito entre Ariano e Lours inicia-se a partir de um triângulo amoroso apenas sugerido na trama, desdobra-se ao longo do século 20, atravessando duas guerras mundiais (ligeiramente diferentes por conta da presença das tecnologias imaginárias), culminando num confronto definitivo nos dias atuais. O romance é tão repleto de citações e homenagens que o autor decidiu inserir um apêndice relacionando boa parte delas.
O foco varia continuamente, sem fixar uma personagem condutora. As duas personagens principais cumprem apenas o papel de antagonistas uma da outra. Inumanas e sem qualidades morais, o leitor não consegue identificar-se com qualquer delas. Algumas personagens coadjuvantes demonstram empatia, mas surgem apenas para serem destroçadas poucas páginas adiante.
A narrativa usa períodos entrelaçados e sobrepostos, saltando do passado para o presente, depois para um passado ainda mais distante, para em seguida voltar tudo de novo, embaralhando a percepção do leitor, e parece ter confundindo também a da editora, que comprometeu o resultado final com gralhas de diagramação, revisão e continuidade.
Ainda que não seja de fato um romance longo, seu final parece chegar rápido demais e sem um grande clímax. O autor até reservou uma boa cena para ele, mas a sequência ininterrupta de ação intensa ao longo de todo o romance nivelou a narrativa num patamar tão elevado que não deixou margem para tal.*
Octavio Aragão é um contista talentoso e demonstrou isso mais de uma vez, porém, neste trabalho, uma narrativa convencional enfatizaria melhor o estranhamento e o vigor narrativo que A mão que cria inegavelmente tem. Até porque o romance, ainda que ágil e empolgante, já exige do leitor uma boa dose de cultura pop internacional e de conhecimento das raízes da literatura de fc&f, sem o que não percebe as inúmeras citações e homenagens que o autor plantou.
Contudo, penso que entendi a ideia geral: que é muito bom que o nosso mundo não tenha seguido o caminho que Octávio Aragão imaginou.

*Em 2018, o autor retornou ao universo de A mão que cria com o romance A mão que pune: 1890, pela Caligari, selo da Editora CJT, do Rio de Janeiro.

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Literatura Fantástica 8

Está disponível a oitava edição da revista Literatura Fantástica, editada por Jean Gabriel Álamo, dedicada ao fantástico brasileiro contemporâneo. 
A publicação tem 180 páginas e traz textos de Chico Santos, Gabriel Madalena, Oghan N'Thanda, Douglas Jansen, Klaus Provenzano, Robson Muniz, Eduardo Henrique, Arthur Mendes, Santos Catarin e do editor. 
Diz o texto de divulgação: "Nesta edição, você encontrará um livro misterioso que o transportará a conhecimentos para além da razão humana, enfrentará uma terrível ameaça sobrenatural dentro de uma taverna, participará de um movimento revolucionário, viajará para estranhas terras em companhia de valorosos amigos e terá como guia um bardo destemido, conhecerá as histórias secretas que envolvem a formação da Irlanda e seres sobrenaturais capazes de arrasar a nossa frágil civilização, viajará até as profundezas em busca de um artefato nas ruínas de Atlântida, enfrentará monstros durante a Era do Gelo e será casado com uma ginoide no fim de nosso século antes de experimentar um traje de combate ao fim do século seguinte, então participará de uma viagem de trabalho rumo a uma estação espacial permeada por situações estranhas antes de ir ao Velho Oeste em busca de vingança".
Literatura Fantástica é publicada unicamente em formato digital e está a venda aqui. As edições anteriores também estão disponíveis.

sábado, 18 de novembro de 2023

Lançamento: A Confissão de Agatha, Louisa May Alcott

A Sociedade das Relíquias Literárias é uma coleção da Editora Wish dedicada à tradução e publicação em ebook de textos raros de ficção fantástica internacional, resgatando obras desconhecidas de autores em domínio público, quase sempre inéditas em português. Uma assinatura mensal dá direito à um novo ebook a cada mês, entre outras recompensas aditivas. 
A relíquia de novembro é a novela A confissão de Agatha (Agatha's confession), da escritora americana Louisa May Alcott (1832-1888), originalmente publicada em 1857. Alcott é mais conhecida pelo seu romance de costumes Mulherzinhas (Little women), de 1868, considerada uma das mais importantes obras da literatura americana.
Diz o texto de apresentação da obra: "Nenhum pecado ou sacrifício pareciam grandes demais se me trouxessem de volta tudo o que eu havia perdido. A jovem Agatha se vê arrebatada, pela primeira vez, pela admiração de alguém. Entretanto, um dia, um olhar denuncia que aquela paixão agora seria concorrida. Uma amizade acabada, um amor em risco, uma confissão imperdoável. Agatha fará qualquer coisa para salvar seu relacionamento, mesmo que tenha que sucumbir a tentações diabólicas".
A confissão de Agatha acupa o número 44 da coleção, tem 99 páginas e tradução de Andrea Coronado. Além da novela, o volume traz a biografia da autora, que morreu aos 55 anos deixando uma vasta produção. 
Para fazer parte da Sociedade, basta formalizar o apoio na página do projeto, aqui.

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Múltiplo 85: os fanzines também têm IA

Está disponível a edição de novembro do fanzine de quadrinhos Múltiplo, editado por André Carim pelo Estúdio Múltiplo, voltado à produção brasileira independente de quadrinhos de ação e aventura. 
A edição tem 95 páginas e entrevista Lancelot Martins, o Catalogador de Universos, quadrinhista que tem uma carreira inteiramente voltada aos fanzines. Também traz quadrinhos de Omar Viñole, Luiz Iório, Carecafdm, Oscar Suyama e do editor, o artigo "E se os super-heróis existissem de verdade?", por Andrej Biasic’s Corner, as colunas "Vi, Li e Gostei...", por Adalberto Bernardino, e "Múltiplos Projetos HQs BR",  pelo editor. A ilustração da capa é uma colaboração de Oscar Suyama.
Ainda podem ser apreciadas grande quantidades de pinups de diversos artistas, parte delas produzidas com o uso de IAs não creditadas, também utilizadas na arte de alguns dos quadrinhos publicados. São imagens bonitas mas de reduzido valor artístico, estilisticamente padronizadas, que empanam o brilho das criações e nada acrescentam à arte, embora certamente facilitem o trabalho do editor. Artigos e colunas em breve serão também gerados assim, se é que já não são, conduzindo a produção editorial à um território perigoso. Há alguns meses, um artigo repleto de informações falsas sobre a ficção científica brasileira foi publicado em um site produzido inteiramente por IA.
Apesar disso, o uso extensivo da IAs na indústria editorial parece inevitável, especialmente depois do episódio do Prêmio Jabuti 2023, que selecionou um trabalho produzido por IA para o certame , depois desclassificado. Ficam as perguntas: qual o sentido de investir nisso em publicações autorais alternativas? Isso é mesmo necessário?
Todas as edições do Múltiplo podem ser baixadas gratuitamente aqui.

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

Lançamento: Ápio e Virgínia, Gertrude E. Trevelyan

O Clube Andarilhos é um serviço de assinaturas da Editora Andarilho dedicado à publicação mensal de livros de bolso de ficção fantástica clássica e inédita, de autores pouco conhecidos. 
Em novembro, a coleção apresenta a ficção científica Ápio e Virgínia (Appius and Virginia), romance de estreia da escritora inglesa Gertrude E. Trevelyan (1903-1941), originalmente publicado em 1932. A autora  foi a primeira mulher a receber  o prêmio Newdigate (pela obra poética Julia, Daughter of Claudius, de 1927), mas produziu apenas mais sete romances, morrendo aos 37 anos em decorrência de ferimentos sofridos após um bombardeio alemão que atingiu sua casa.
Diz o texto da quarta capa: "Solteira e cansada da solidão, Vigínia Hutton decide deixar tudo para trás e se isola em uma cabana, onde cria o orangotango Ápio e tenta, sob o pretexto de um experimento particular, educá-lo como um homem. Virgínia usará todos os métodos ao seu alcance para ter sucesso nessa empreitada".
A ideia de animais elevados a condição humana é um tema bem explorado na ficção científica, tendo atingido o ponto alto no romance Startide rising, de David Brin (1983), inédito no Brasil mas disponível em uma edição portuguesa na Coleção Europa-América, infelizmente não muito fácil de encontrar. 
Ápio e Virgínia tem 356 páginas, tradução de Gustavo Terranova Aversa e é o 14º volume da coleção. Junto ao volume, os assinantes recebem, além de um marcador de páginas personalizado, um simpático chaveiro do orangotando Ápio.  
Os livros do Clube Andarilhos são comercializados inicialmente por assinaturas mas, após alguns meses, são oferecido para venda no saite da editora, aqui.

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Resenha do Almanaque: A ira da águia, Humberto Loureiro

A ira da águia
, Humberto Loureiro. 350 páginas. Porto Alegre: Literalis Editora, 2006.

A ficção científica brasileira detém, com certo orgulho, alguns temas que lhe são muito caros e recorrentes, entre eles destaca-se o das guerras amazônicas, que trata da invasão da Amazônia brasileira por uma força estrangeira poderosa, com maior frequência vinda dos Estados Unidos da América.
Os brasileiros, de forma geral, enxergamos a Amazônia como um tipo de reserva estratégica, que deve ficar intocada até que nós mesmos tenhamos condições técnicas de explorá-la. Afinal, temos para isso os sagrados direitos assegurados pelas leis internacionais. Mas não nos incomodamos muito com os interesses autênticos das populações que lá vivem e, com nossa passividade histórica, obrigamos esses seres humanos a subsistirem pouco melhor que os animais selvagens, vivendo em meio a inúmeras carências de recursos financeiros, sociais e urbanísticos.
Enganamo-nos com os discursos ecológicos românticos de que saberemos conquistar esse "inferno verde" com mais inteligência do que fizemos com a parte já devidamente devastada do território nacional, que respeitaremos mais e melhor as populações indígenas e caboclas lá instaladas do que qualquer potência estrangeira, demonizadas como forças exclusivamente extrativistas. Mas é claro que não será assim. Sejam americanos, japoneses, alemães ou canadenses, não farão nem pior nem melhor que os brasileiros. Mas o mito existe e, como tal, é argumento ideal para as histórias da antecipação.
Humberto Loureiro, carioca, médico e engenheiro civil, estreou no mercado editorial com A ira da águia, romance ambicioso que conta como a maior força militar do planeta resolveu tomar, na marra, o controle político da Amazônia.
O primeiro capítulo segue à risca as orientações dos autores experientes, pois é a melhor parte de todo o romance. Principia em 2016, mas reconta, em retrospectiva, algumas décadas da história brasileira recente. Já com forte presença na Amazônia, especialmente ao longo do Rio Amazonas e seus afluentes, várias organizações particulares e governamentais dos EUA garantem que as empresas norte-americanas lucrem com a exploração ilegal das riquezas da região, mantendo ao lado deles a maioria dos habitantes ribeirinhos através da realização de atividades assistenciais de baixo custo. Quando a Marinha Brasileira retém dois barcos americanos e suas respectivas tripulações, por transporte de madeira ilegalmente extraída, o governo americano aproveita o fato para forçar um confronto político, acusando o Brasil de maus tratos à tripulação detida e exigindo a libertação imediata e incondicional das embarcações. Como o governo brasileiro, alegando soberania, não acata o ultimato, os EUA enviam uma força tarefa para libertar os detidos e assumir o controle em toda a região. Formada por um porta-aviões de última geração e um moderno cruzador de escolta, a força tarefa seria, em tese, mais do que suficiente para resolver a questão. Porém, algo inesperado acontece. Depois de afundar um navio-patrulha brasileiro que a interceptou, a frota americana desaparece misteriosamente, próximo à foz do Amazonas.
A CIA e todos os demais órgãos de inteligência militar americana não conseguem explicar como desapareceram o poderoso porta-aviões e sua escolta, pois nada pode ser comprovado através das imagens colhidas por satélite. O depoimento do capitão de um submarino nuclear americano que acompanhava em segredo a força tarefa só corrobora a falta de explicações, uma vez que a única embarcação claramente identificada nas proximidades fora uma pequena e mal armada fragata brasileira, que não disparara um único tiro durante o incidente. Aparentemente, as belonaves americanas explodiram expontaneamente.
O governo americano conclui, então, que outro país ajudou o Brasil com algum tipo de submarino moderníssimo e, com esse argumento, passa a pressionar a ONU para intervir na questão, enquanto usa outros subterfúgios para obter as informações que certamente estão faltando.
Ao longo das trezentos e cinquenta páginas do livro, a CIA vai aos poucos desvendando o mistério, com um agressivo esquema de espionagem apoiado em sequestros e assassinatos de oficiais da marinha brasileira, enquanto o governo americano manobra forças políticas e lobbys internacionais infiltrados no Legislativo brasileiro, de forma a desestabilizar o governo com uma crise política interna. O que eles vão descobrir muito depois é o que o leitor já sabe desde o início do livro: sob as barbas da espionagem americana, a Marinha Brasileira desenvolveu, em segredo, um poderoso indutor de ferrugem por rádio, que pode desintegrar qualquer equipamento metálico em segundos. E que a inexpressiva fragata brasileira utilizou essa arma para vencer o conflito de 2016 e pode usá-la novamente.
A graça da história está na forma como o autor antepõe as estratégias de espionagem americana e de dissimulação da Marinha Brasileira, num jogo de gato e rato, mas de um rato que ruge.
Não há personagens que conduzam a trama, que é contada através de flashs das reuniões do alto escalão dos governos americano e brasileiro: presidentes, generais e comandantes militares, ministros, chefes de departamento de inteligência, senadores, deputados etc. No meio disso tudo, há o pequeno drama do jovem cientista militar que descobriu o princípio físico com que a arma secreta brasileira funciona, seu relacionamento amoroso conturbado e a violência política que o atinge, mas esse drama recebe pouca atenção do autor.
Após a leitura do romance, fica uma impressão estranha: a de que todas as ações norte-americanas no mundo são movidas por interesses escusos e que toda contraviolência de suas vítimas é justificada. Ainda que, no livro, os líderes brasileiros tenham motivos nobres ao adotar métodos não ortodoxos para atingir seus objetivos, alguns deles são, no mínimo, antiéticos e isso soa como justificativa a certas atitudes de governos brasileiros recentes. O autor chega a defender líderes como Saddan Hussein e Slobodan Milosevich, que teriam sido vítimas da anti-propaganda americana mundial. Melhor seria se Loureiro tivesse evitado uma abordagem tão polarizada, sem meios tons. É um discurso perigoso, que não colabora para com a boa vontade entre os homens.
Afora esse pecado, o livro é interessante e bem redigido. As sequências de ação estão bem descritas, com detalhes nítidos das atitudes dos personagens e dos equipamentos utilizados, e bom domínio dos jargões militar e político. Um detalhe a mais para divertir o leitor são os nomes dos personagens: Donald Keegan, Célio Brandt, César Portela, Henry Flood, Thomas Bennett, Paul Hoover, John Carter, Norton Tavares de Mello, e por aí vai.
A edição da Literalis é caprichada, com acabamento de muito bom gosto e excelente trabalho de revisão. Vale a pena conferir este romance invulgar, talvez um dos poucos, senão único, exemplo de tecnotriller brasileiro.

terça-feira, 14 de novembro de 2023

Lançamento: Ordem Vermelha - Crianças do silêncio

Está em pré-venda, com lançamento previsto para o início de dezembro durante a ComicCon Experience deste ano, o segundo e último volume da série de alta fantasia Ordem Vermelha, subtitulado Crianças do silêncio
A série foi iniciada com Filhos da degradação, do escritor paulistano Felipe Castilho, publicado em 2017 pela Editora Intrínseca. O novo volume chega pela mesma editora, mas com créditos compartilhados com Rodrigo Bastos Didier e Victor Hugo Sousa. 
Diz o texto de divulgação: "Raazi e Yanisha arriscaram a própria vida para revelar a farsa da deusa Una, na esperança de acabar com um sistema de servidão milenar. Esse feito foi o estopim de uma grande rebelião, que o exército maculado esmagou de forma violenta e traiçoeira. Aqueles que conseguiram escapar dos muros de Untherak adentraram um deserto imenso, talvez infinito, onde não parece haver nada além de areia. Porém, é nesse território inóspito que uma vingança vem sendo planejada há gerações pela última representante de um povo esquecido. Enquanto isso, o falcoeiro Aelian, desgarrado de seus amigos, expande as fronteiras da própria mente, aprende a manipular os elementos essenciais da carne e da alma e faz descobertas chocantes sobre a verdadeira origem das seis raças. O mundo é muito mais vasto do que todos eles jamais imaginaram… e a verdade sobre Untherak, muito mais devastadora".
O livro tem 496 paginas e pode ser adquirido aqui.

segunda-feira, 13 de novembro de 2023

Mais redes sociais por assinatura

As plataformas de financiamento direto oferecem diversos projetos de financiamento recorrente, isto é, que fazem uso de assinaturas com contribuição mensal fixa e recompensas na forma de dinâmicas e brindes exclusivos aos quais apenas os assinantes têm acesso, tornando a experiência algo bem mais focalizado. E, entre eles, há os que se voltam à literatura fantástica. 
Se sua experiência nas redes sociais anda insatisfatória, talvez seja hora de considerar algo mais específico. Por exemplo:
Coordenado pela professora de inglês Jéssica Louise Werner, trata-se de um grupo online de discussões de contos de terror em inglês, que também oferece sessões cinema online, cards colecionáveis, brindes digitais e sorteios mensais de livros.
Promovido pelas editoras Laboralivros, Urso e BuruRu, oferece textos asiáticos antigos, raros e inéditos, enviados mensalmente para os assinantes em formato digital, além de acesso a um grupo exclusivo no Telegram.
Revista de contos editada pelo Movimento RPG, publicada trimestralmente em formato digital. 
Iniciativa da editora Raphus Press que oferece ao assinante livros do bolso, concertinas e plaquettes esclusivos em formato físico, com contos, novelas curtas, poemas e ensaios ferozes e heréticos. 
Há muito mais, basta procurar.

sábado, 11 de novembro de 2023

Resenha do Almanaque: Hyperfan - Cinco anos de fanfic

Hyperfan: Cinco anos de fanfic
, Lucio Luiz, organizador e editor. Ilustrações de J. J. Marreiro, 130 páginas. 2006.

Antologia comemorativa aos cinco anos de publicação do saite Hyperfan, que se alinha à prática da fc&f brasileira de publicar antologias temáticas. Um tema um tanto aberto, contudo, pois trata-se de universo compartilhado ainda sem estrutura, que o organizador planejou montar a partir do simples elencamento dos contos selecionados. 
O Novo Universo Hyperfan, assim chamado, é de inspiração assumidamente vinculada ao cânone dos super-heróis. O organizador/editor confessa, na apresentação do livro, que isso foi feito tão somente porque seria temerário utilizar um universo que tivesse os direitos reservados. Ou seja, apesar de original, o Novo Universo Hyperfan é um pastiche, o que nestes tempos de rede mundial é chamado de fanfic.
Fanfic é a contração do termo fanatic fiction ou, traduzindo para o português, ficção de fã, o tipo de texto realizado por fanáticos em algum personagem ou série de aventuras. Há bibliotecas gigantes disponíveis na internet com fanfics dos apreciadores de Star trek ou Harry Potter, por exemplo.
Dentre todos os temas possíveis, o das histórias em quadrinhos de super-heróis é o que oferece o material de base mais maleável: a falta de parâmetros realistas permite que os autores-fãs façam qualquer coisa sem parecer demasiado absurdo. Mas a maioria dos fanfics de super-heróis não arrisca ir além, pois os autores querem justamente repetir os moldes tradicionais de seus personagens favoritos, não subvertê-los. Portanto, a decisão do editor de Hyperfan, ainda que não por esse motivo, foi muito acertada. A obrigação de criar novos personagens deu liberdade aos autores para construírem histórias que nunca seriam contadas com heróis de contornos anglo-americanos, ainda que alguns deles não tenham aproveitado essa chance em sua totalidade.
A antologia pode ter se inspirada na série Wild Cards, editada por George R. R. Martin, que também apresenta o modelo de histórias independentes que progridem a partir de um conto-chave. Trata-se de uma série antologia de contos de super-heróis bastante popular, publicadas de 1987 até hoje, que também tem adaptações em quadrinhos e até uma série de tv, de 2003. 
Hyperfan é formada por treze contos irradiados a partir de um conto-base, o ponto de partida para a criatividade de cada autor. São, portanto, histórias de "origem", o tipo menos interessante de histórias de super-heróis. Os contos são curtos e não progridem muito além da simples apresentação dos personagens. Ainda assim, alguns trabalhos logram bom resultado e podem render romances curiosos, se continuados.
O conto que propõe ser a espoleta dos eventos narrados nos demais contos é "Energia do vácuo", assinado por Carlos Orsi. O autor é conhecido no meio da fc&f brasileira, presente em várias antologias e com várias coletâneas individuais publicadas. Praticamente uma vinheta, conta apenas como uma energia estranha se esparramou pela Terra depois que um objeto cósmico atingiu o planeta, produzindo um poço estreito e profundo numa ilha perdida. A ilha remete-se a que serve de cenário ao seriado de tv Lost, e o objeto lembra a esfera luminosa do longa de animação Heavy metal: Universo em fantasia. Sua função deveria ser costurar os episódios numa sensação de unidade. Mas a presença do conto na antologia não chega a se justificar, uma vez que nenhum dos contos selecionados importou-se em articular-se a ele. Ficou cada um por si.
"Fã", de Danilo Anastácio, abre a série. Thimothy é um universitário nerd que desconfia das atividades de um de seus professores. Obcecado por super-heróis, veste-se como um e decide abordar o docente de forma direta, mas acaba sendo um tanto indiscreto: como ganhou super-poderes reais, acaba fazendo um grande estrago. Uma divertida brincadeira com a autoimagem dos fãs, sem maiores pretensões.
A seguir, "Sombra", de Marcelo Augusto Galvão. Um suicida fracassado desenvolve uma segunda personalidade que mata e devora partes de seu sócio e de sua namorada quando descobre que eles o traíram. História moralista e sem muita originalidade.
"Romaria e Prece", de J. B. Uchôa, é um dos melhores contos da antologia. Uma prostituta descobre, em pleno expediente, que tem o poder de curar aqueles a quem toca. Seu então cliente, um político importante, ao ver-se curado de uma doença grave, revela o fato à imprensa. Agora todos acreditam que a prostituta é uma santa e ela tem que fugir para reencontrar alguma paz. Bem ambientado na cidade de Salvador, é um dos contos que merece maior atenção.
Rodrigo Nunes assina "Emoções". Depois de uma tentativa de assalto, uma jovem médica descobre que pode sentir as emoções das pessoas que estão à sua volta. Suas atitudes estranhas fazem com que seus pais acreditem que ela enlouqueceu. A ideia é boa mas a realização, ruim, pois o autor abusa de frases curtas, num texto telegrafado e enfadonho.
Em "O detetive do sobrenatural", de Rafael Monteiro, um detetive trapaceiro descobre que pode falar com os mortos, e faz um acordo com um fantasma para ajudá-lo no serviço. Conto muito fraco, que transcreve as primeiras cenas do filme Espíritos, de Robert Tinnell.
"Supertia", de Lucio Luiz, mostra personalidade e bom ritmo. Uma estudante secundarista tem a oportunidade de dar aula numa pré-escola. Depois de um início tumultuado com uma turma muito difícil, descobre que pode controlar as crianças dando-lhes ordens diretas. Apesar de ter uma classe obediente, as crianças passam a depender cada vez mais de suas ordens, até que acontece uma tragédia. A narrativa em primeira pessoa é divertida, porque a jovem professora é uma completa cretina. Apesar disso, fica uma sensação de que algo está errado em seu conceito, já que o autor sugere que toda a arrogância da garota decorre do fato dela acreditar nos estudos.
"Prólogo", de Conrad Pichler, é uma espécie de Cidade de Deus de terror. Conta como um homem muito mau, morto numa briga de gangues, volta do inferno para vingar-se. Mas ele não esperava que os seus desafetos ainda vivos tivessem super-poderes para enfrentá-lo. Derrotado o espírito do mal, os sobreviventes decidem continuar a luta contra as trevas. Um conto confuso, difícil de compreender e com um grau de violência que não se justifica.
O conto seguinte é "Prata da casa", de Rony Gabriel. Assassino profissional se vale da capacidade de ser esquecido para despistar seus algozes. Entre eles, uma policial que é imune ao seu poder. Mas ela acaba sendo auxiliada por ele, depois de sofrer um atentado praticado por seu próprio parceiro. O conto não disfarça a inspiração no personagem Questão, sem mais a acrescentar.
"Freaklândia", de Robson Costa, é de longe o melhor conto da antologia. Muito bem construído, conta a história de uma médica em crise profissional que aceita trabalhar numa operação sigilosa do governo, em uma cidade no interior de Mato Grosso do Sul onde várias pessoas subitamente desenvolveram estranhas mutações. Depois de algumas semanas de trabalho, ela acaba envolvida pela irmandade desses mutantes e torna-se ela mesma um deles depois do contato com uma bolha de luz que os mutantes guardam como um tesouro. A narrativa distancia-se da mitologia dos super-heróis por conta da utilização de uma narração típica da fantasia latina e da presença intimidante da repressão políticomilitar patrocinada por forças internacionais, o que fala muito ao imaginário brasileiro.
"The world is blue", de Eduardo Sales Filho, mostra como um empresário ambicioso enriquece utilizando sua capacidade de influenciar a mente das pessoas. Frívolo e arrogante, repentinamente vê-se ajudando uma mulher que estava sendo vítima de um sequestro-relâmpago. Apesar de desprezar as pessoas comuns, ele aprecia a sensação de poder sobre elas. Talvez uma sequência à história pudesse corrigir a inversão de valores que este conto sugere, mas a introdução, infelizmente, não anima muito.
"Vítima", de Cesar Rocha Leal, fala sobre um investigador de polícia dotado de poderes extra-sensoriais. Por usá-los em suas investigações, é ridicularizado pelos colegas. Mas ele não apenas resolve todos os mistérios do crime proposto no conto como também identifica o criminoso, tudo sem precisar sair da sala. O conto parece homenagear mais os seriados televisivos de histórias policiais e os romances de Sherlock Holmes do que os quadrinhos de super-heróis e, por isso, destaca-se dos demais. Mas a falta de virtuosismo literário compromete, resultando num trabalho de pouco brilho.
"Incógnitos", de Rafael Borges, conta a história de uma banda de rock famosa – os Incógnitos do título – cujos integrantes têm superpoderes. No meio de um show em Tóquio, são atacados por um dragão e têm de improvisar para derrotá-lo. O público delira ao ver o combate e o show continua depois dele. O conto faz rir, que é o que o autor queria, mas pelos motivos errados, pois expõe o ridículo das histórias de super-heróis num livro que pretende ser uma homenagem a eles.
"Salão de espelhos", de Alexandre Mandarino, encerra a antologia. Trata de um jovem que ganha todos os poderes imagináveis e, usando-os, molda o mundo a sua imagem. Então, cheio de tédio, desfaz tudo e abandona o mundo, indo para as estrelas. Mandarino demonstra domínio da língua e apresenta um conto bem trabalhado mas, apesar das virtudes, a antologia teria ficado melhor se o seu conto não fosse o último do volume. Isso porque ele passa uma forte impressão de escárnio sobre gênero dos super-heróis e sobre própria antologia em si, sintoma que se reforça por dar-lhe os contornos finais. É como se o editor, ao deixá-lo por último, quisesse levar o leitor a sentir-se tolo por ter investido o seu tempo na leitura do volume. Pelo menos foi essa a impressão que causou em mim.
Além dos contos, é importante citar o trabalho de J. J. Marreiro, que demonstra domínio sobre o gênero ao realizar as ilustrações que emolduram cada um dos contos e o índice, aproximando o livro dos leitores habituados apenas com quadrinhos e dando-lhe uma jovialidade bem-vinda.

sexta-feira, 10 de novembro de 2023

Resenha do Almanaque: A face oculta da galáxia, Miguel Carqueija

A face oculta da galáxia
, Miguel Carqueija. Prefácio de Jorge Luiz Calife, 88 páginas. Taubaté: Casa da Cultura, 2006.

Vésper é uma agente secreta aposentada. Depois de uma missão especialmente traumática, na qual seu marido morreu, decidiu que era hora de parar. Muitos anos depois, com os filhos já crescidos, Vésper é procurada pela Cosmopol, a polícia interplanetária, que a quer num caso muito delicado: Teplê K Vichits, o terrorista interestelar, capturou um artefato alienígena que tem que ser devolvido ao seu lugar de origem, caso contrário o universo pode ser destruído. Como passa por dificuldades financeiras, Vésper aceita o encargo e, assim, é apresentada a seus companheiros de missão: Rotterdam, Tenessee e a assassina profissional Valentina, recrutada especialmente para matar Vichtis.
Os quatro agentes, liderados por Beng, o delegado da Cosmopol encarregado de comandar a operação, embarcam disfarçados numa espaçonave de cruzeiro em direção ao distante planeta Sombrio, onde Vichtis escondeu o artefato. Logo de saída, Vésper se vê assediada por Valentina, que deixa claro que tem um interesse especial por ela. Mas Vésper a rejeita e isso tensiona a relação entre ambas.
A tranquilidade da viagem, bem como as identidades falsas da equipe, não resistem por muito tempo. Poucas horas após a decolagem, os agentes da Cosmopol são atacados por espiões inimigos. Eles abandonam a nave em botes salvavidas e são resgatados por uma outra nave, que os acompanhava em segredo a pedido da Cosmopol. O comandante dessa nave é Gaspar, cientista desafeto de Beng, que viaja para Sombrio sob disfarce, levando uma equipe de pesquisas e sua neta Licia, uma garota esperta e atrevida que se identifica com Vésper na mesma medida que antipatiza com Valentina.
Quando a nave chega à embaixada terrestre em Sombrio, os agentes assumem novos disfarces e dirigem-se ao local onde o artefato está escondido, mas não contavam que Licia os acompanhasse clandestinamente. A presença da garota causa muitas dificuldades ao grupo, novamente atacado por organizações inimigas e que ainda tem que se defender das forças regulares de Sombrio.
Esta novela de Miguel Carqueija apresenta as principais características que o autor adota em seus trabalhos: personagens femininas fortes e decididas, ainda que emocionalmente fragilizadas, enfrentando perigos inomináveis. O mesmo perfil pode ser percebido em muitos dos trabalhos do autor, como A âncora dos argonautas (1999), A rainha secreta (2001), A Esfinge Negra (2003) e As luzes de Alice (2004), Tempo das caçadoras (2009), As aventuras de Honney Bel (2017) e Os mistérios do Mundo Negro (2021), títulos publicados por editoras independentes como a Scarium e o próprio Hiperespaço. Mais recentemente, teve romances publicados por editoras estabelecidas no mercado, como Farei o meu destino (Giz, 2008) e O estigma do Feiticeiro Negro, em parceria com Melanie Evarino (Ornitorrinco, 2012).
Miguel Carqueija é um autor experiente, talvez o mais prolífero e constante colaborador das publicações daquela que ficou conhecida como Segunda Onda da ficção científica brasileira. Esteve presente em praticamente todas as publicações brasileiras de FC&F, desde o primeiro fanzine, o Boletim Antares – editado pelo Clube de Ficção Científica Antares, de Porto Alegre inaugurador dessa fase em 1982 –, participando de todos os demais fanzines, revistas, concursos e antologias propostos ao longo dos anos. 
Com toda essa experiência, Carqueija ganhou muita habilidade nos protocolos da literatura fantástica, que domina muito bem. Entretanto, não os respeita o tempo todo e até compromete o ritmo da leitura e  a suspensão da incredulidade do leitor ao fazer contínuas referências e citações à cultura pop, e alterar a forma narrativa em meio ao texto, como, por exemplo, adotando o estilo de um roteiro, com os nomes das protagonistas antecipando as falas. 
Excetuando-se esses "pecados", que muitos experimentalistas consideram uma ousadia literária enriquecedora, a prosa de Carqueija é fluente e agradável, com uma estética identificada com os trabalhos da Golden Age norte-americana: aventuresca, otimista, quase sempre implausível, mas muito divertida. As  também interferem na concentração do leitor, mas não chegam a comprometer a narrativa e acrescentam-lhe um sabor autoral característico.
A face oculta da galáxia está atualmente disponível aqui pela editora Agbooks, em versões real e digital.

quinta-feira, 9 de novembro de 2023

Revista Égua Literária

Égua Literária é um periódico trimestral digital dedicado à ficção especulativa que propõe dar protagonismo e visibilidade para autores e temas da Região Norte do país. 
Contemplada em um edital da Lei Aldir Blanc, pela Secretaria de Cultura do Estado do Amapá, a publicação lançou suas primeiras edições, do número zero ao número 3 ao longo de 2023, o que corresponde ao primeiro ano de publicação. 
O número zero, subtitulado O Norte pelo Norte, trouxe contos de Fernando Canto, Roberta Spindler e Jan Santos, além de um manifesto com os objetivos da ação. 
No número 1, Causos de visagem, apareceram textos Gabriel Espindola, Júlio Ardaia e Thyago S. da Costa e entrevistas aos autores Andrei Simões e Tanto Tupiassu.
O número 2, Toca as marcantes, maninha!, foi dedicado à musicalidade nortista, com contos de Luana Cruz, Gabriela L. K. Lins, Thiago Ambrósio Lage, Tarcila Alves e Luciana Fauber, além de entrevistas com os cantores Alan Yared e Aqno e com a cantora Patrícia Bastos.
O número 3 recebeu o subtítulo Cupim de asa pra todo lado e teve a palavra "chuva" como tema. Trouxe textos de Suzana Linhares, D. L. Borges, Beatriz Ferreira da Costa, Jan Santos e Raphael Carmesin, ensaio de Samya Tirza Barbosa.
Para seguir adiante, os editores lançaram uma campanha de assinaturas cujo primeiro número é o 4, Égua Punk, inteiramente dedicado à ficção científica com contos de Luana Cruz, André R. P. Reis, Bia Chaves, Gabriel Espindola e Gabriel Yared, entrevistas com o artista afrofuturista GC, a banda Steamy Frogs e o ilustrador Caio Alves, que assina a capa dessa edição. 
Visite a página do projeto aqui e informe-se sobre os diversos pacotes de assinatura e suas respectivas recompensas.

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Revista Noturna

Editada por Maíra Ferreira e Luísa Montenegro para a editora Escambau, a revista literária digital Noturna é dedicada à publicação de histórias de horror escritas e protagonizadas por mulheres.
A edição de estreia foi publicada em maio de 2022, tem 65 páginas e trás contos de Tatiana Faraújo, Morgana Feijão, GabiOZ e Luísa Montenegro. 
Após essa publicação, a revista passou por um longo interregno, sendo que a segunda edição só chegou agora em outubro de 2023, quase um ano e meio depois. Tem 96 páginas e traz textos de Bethânia Pires Amaro, Lis Vilas Boas, Maria Clara Lacerda, Morg. Rocha e Vitória Vozniak, explorado os diferentes significados da palavra "mancha" que, nas palavras da editora "simboliza as marcas deixadas pelas expectativas e pressões sociais impostas a todas nós, mas também como subversão, um protesto daquelas que não se submetem ao padrão higienizado e dócil da sociedade patriarcal". 
Ambas as edições estão disponíveis para download gratuito nos respectivos links.

terça-feira, 7 de novembro de 2023

Lançamento: Terra mágica

Terra mágica
é uma antologia incomum de contos de fantasia que reúne escritores brasileiros e indianos. 
Diz a abertura do prefácio, assinado pelo escritor Saulo Adami: "Brasil e Índia podem ser definidas como nações mágicas, considerando alguns episódios de sua história, personagens folclóricos e algumas lendas que remontam às origens dos seus territórios e à autodeterminação de seus povos. Quinze contos originais de fantasia e realismo mágico de nove autores do Brasil e de seis autores da Índia, reunidos sob o título de Terra Mágica, estão contidos nesta que é uma das mais exóticas e criativas publicações criadas e organizadas pela escritora e editora Lu Evans, que tem suas raízes no Brasil, vive e trabalha nos Estados Unidos."
Publicada em ebook por iniciativa da organizadora, sob a chancela do selo Nebula, a coletânea traz contos de Kiran Kaur Saini, Ana Lucia Merege, Diego Guerra, Vikram Kapur, Heidi Gisele Borges, Clinton Davisson, Neethu Krishnan, Divanize Carbonieri, Jaime de Andruart, Subi Taba, Liana Zilber Vivekananda, Vinicius Barreto de Oliveira, Binod Dawadi, Oghan N’Thanda e Aashmika, sendo os textos indianos traduzidos pela organizadora.
O volume tem 190 páginas e pode ser adquirido aqui.

segunda-feira, 6 de novembro de 2023

Lançamento: Filhos da Lua, o legado esquecido, de Marcella Rossetti

Está em pré-venda o novo romance de Marcella Rossetti, O legado esquecido, terceiro volume da série de fantasia urbana com lobisomens Filhos da Lua, iniciada com O legado, publicado em 2015, e O legado sombrio, de 2020, além da novela gráfica Noites da aniquilação, também de 2020. 
Diz o texto de divulgação: "As revelações sobre a Noite da Aniquilação fazem desaparecer a linha entre heróis e vilões, provocando consequências perigosas não apenas para Bianca Bley, mas para toda a sociedade Karibaki. Para completar, uma perigosa linhagem se ergue, determinada a reivindicar não apenas o seu espaço, mas a sua verdadeira herança. Enquanto isso, Bianca e seus companheiros precisam tomar medidas desesperadas a fim de salvar aqueles que amam, antes que um antigo mal desperte e destrua o mundo que conhecem".
O volume tem 296 páginas e é um lançamento da Editora Avec.

domingo, 5 de novembro de 2023

Resenha do Almanaque: A fantástica viagem imaginária de Augusto Emílio Zaluar, Edgar Indalecio Smaniotto

A fantástica viagem imaginária de Augusto Emílio Zaluar: Ensaio sobre a representação do outro na antropologia e na ficção científica brasileira
, Edgar Indalecio Smaniotto. 196 páginas. Rio de Janeiro:  Corifeu, 2007.

Um dos filões editoriais que tem sido atacado com entusiasmo pelos fãs brasileiros de ficção científica e fantasia é o dos estudos acadêmicos. Há até pouco tempo, contavam-se nos dedos de uma única mão os livros de não-ficção disponíveis em língua portuguesa sobre o gênero.
Os títulos históricos, publicados ao longo do século 20, geralmente tratavam da produção estrangeira, sendo que o mais importante texto sobre a ficção científica produzida no Brasil foi, por muito tempo, o prefácio escrito por Fausto Cunha para a edição brasileira de No mundo da ficção científica (Science fiction reader's guide), de L. David Allen (Summus Editorial, SD).
Em 2007, os leitores interessados nesse tipo de literatura puderam compartilhar das conclusões de A fantástica viagem imaginária de Augusto Emílio Zaluar, publicado pela Editora Corifeu, dissertação de mestrado de Edgar Indalecio Smaniotto sobre a vida e a obra do escritor luso-brasileiro Augusto Emílio Zaluar que, em 1875, teve publicado em dois volumes o romance O Doutor Benignus, obra considerada como um dos primeiros exemplos da ficção científica brasileira. A dissertação foi defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Unesp de Marília, orientada pela Professora Doutora Christina de Rezende Rubim, que também assina o prefácio do volume.
Smaniotto atua no ensino fundamental da cidade de Marília, onde nasceu e reside. Também é colaborador frequente das publicações do fandom brasileiro, geralmente com textos de análise literária, e mantém um produtivo canal com vídeos dedicados à literatura fantástica, chamado Filosofia da Astronáutica e da Ficção Científica.
O trabalho está dividido em seis partes. As duas primeiras são “Augusto Emílio Zaluar: Esboço de uma trajetória” e “Entre o relato de viagem e a moderna antropologia”, e dizem mais respeito ao homem Zaluar, sua biografia e sua participação da vida político-cultural na capital do Império Brasileiro. Neles, sabemos que Zaluar nasceu em Lisboa em 1826 e não completou os estudos em medicina para dedicar-se ao ofício de escrever, principalmente na área jornalística. Porém, como não havia possibilidade de se sustentar exclusivamente da escrita em seu país natal, em 1850 Zaluar migrou para o Brasil e aqui se estabeleceu como jornalista. Seus interesses nas ciências, especialmente na antropologia, o levaram a se dedicar aos estudos sobre o homem brasileiro e o seu lugar no mundo. Zaluar acompanhava atentamente os trabalhos das missões científicas no Brasil e isso fica claro na leitura de O Doutor Benignus, pois Zaluar faz questão de citar cada um dos seus inspiradores, inaugurando junto com o gênero uma mania que está cada vez mais em destaque entre os autores brasileiros de ficção científica e fantasia. O conhecimento de Zaluar a respeito do trabalho de campo dos antropólogos está retratado no romance na figura de William River, personagem sequestrado por uma tribo de índios caiapós na Ilha do Bananal, destino final da expedição de Benignus.
Na terceira parte, “A origem do homem: monogenismo e poligenismo”, descobrimos que Zaluar compartilhava da teoria de que o homem teria se originado na América – especialmente no Brasil – e que tinha confiança que mais cedo ou mais tarde essa teoria seria confirmada. Por isso seu personagem em O Doutor Benignus vai encontrar um crânio humano fossilizado, preservado numa providencial caverna no planalto central.
Até aqui, a leitura da dissertação de Smaniotto é conquistada a duras penas. O texto é truncado e repleto de citações e notas de rodapé, algumas bastante longas. Embora o tema não seja enfadonho, não parece ao leitor que se trata de um trabalho sobre ficção fantástica pois o que se falou esteve principalmente associado à pessoa de Zaluar. Entretanto, na segunda metade, o texto ganha contornos pungentes na medida em que Smaniotto aborda os temas que levaram os estudiosos a classificarem o romance de Zaluar com ficção científica de fato.
A teoria da habitabilidade dos mundos é o tema  da quarta parte do estudo, “Seres imaginários do espaço”. Aqui aparece a fascinação de Zaluar pelas teorias do cientista francês Camille Flammarion sobre a habitabilidade dos outros planetas dos Sistema Solar e até mesmo do Sol e das estrelas, misturando ciência com doutrinas espiritualistas numa real antecipação do que viria a ser a popular ideia dos discos voadores, muitas décadas depois. Mas o trecho em que Benignus trava contato com um habitante do Sol – um ser feito de luz e energia radiante – acontece durante um sonho do sábio, depois de adormecer sobre os restos calcinados de um meteorito recém-precipitado. É curioso notar que a expedição de Benignus foi proposta principalmente para comprovar que o Sol seria habitado, e Zaluar argumenta que seu personagem teria essa certeza apenas por observar as manchas solares através de seu telescópio. Sendo essas manchas, na interpretação do autor, fenômenos similares ao olho de um furacão, na sua lógica, a superfície do Sol seria fria e, portanto, habitada. Simples assim. Comprovada a habitabilidade do Sol, fica também comprovada a habitabilidade de qualquer outro astro.
A ficção de Zaluar frente a seus contemporâneos Júlio Verne e H. G. Wells é tema em “Estabelecendo comparações: o Doutor Benignus diante do romance científico europeu”. Nesta parte encontra-se o melhor do estudo para o leitor interessado em ficção científica. Smaniotto faz um relato rápido sobre a influência explícita de Júlio Verne na prosa de Zaluar, especialmente quando este insere um balão na sua história, a moda de Cinco semanas em balão, de Verne. Smaniotto observa ali a antecipação da dirigibilidade dos balões, tecnologia que só seria conquistada no início do século 20 por Alberto Santos Dumont. Apesar de ser uma interpretação romântica e uma forma de dar a Zaluar um arremedo da autoridade verniana, é um exagero. Zaluar definitivamente não deu dirigibilidade alguma ao seu balão em O Doutor Benignus, que só chegou aonde chegou – e no momento mais que oportuno diga-se de passagem – por conta de uma tempestade que o carregou na direção certa. Pelo menos neste caso, Zaluar não antecipou nada.
Mas as melhores sacadas de Smaniotto estão nas comparações com Wells, especialmente na análise das diferenças culturais na representação do alienígena. Para Wells, o alienígena é um agressor, uma força de ocupação que humilha a arrogância britânica, enquanto que para Zaluar o alienígena é um ser espiritualmente evoluído que traz uma mensagem pacífica e edificante, e reconhece a promessa de um futuro glorioso para o país.
Smaniotto prepara o fechamento de seu trabalho na sexta e última parte, intitulada “A formação de um mito cultural: o alienígena na literatura brasileira”. Aqui, o autor cita principalmente Ficção científica brasileira: Mitos culturais e nacionalidade no país do futuro, da brasilianista Elisabeth Ginway (Devir, 2005) e Ficção científica, fantasia e horror no Brasil: 1875 a 1950, de Roberto de Sousa Causo (UFMG, 2003), como referências para concluir que o mito do alienígena é uma característica da ficção científica brasileira na medida em que valida todos os demais componentes da mítica nacional, colocando O Doutor Benignus numa posição de importância nas Letras e, especialmente, para os estudiosos da ficção científica no Brasil.

sábado, 4 de novembro de 2023

Conexão Literatura 101

Está disponível a edição de novembro do periódico eletrônico Conexão Literatura, editado por Ademir Pascale, dedicado à divulgação de novos autores e obras da literatura brasileira. 
A edição tem 169 páginas e destaca o personagem Arsène Lupin, o ladrão elegante criado pelo escritor francês Maurice Leblanc, que ganhou muita visibilidade recente devido à série de tv que é o tema da matéria de abertura, completada por entrevistas com Ronaldo Júlio – um dos dubladores da edição brasileira da série – e também com a escritora Simone Saueressig que, em 2022, publicou o romance O jovem Arsène Lupin e a dança macabra, pela editora Avec.
Também são entrevistados na edição os escritores Fauno Mendonça, Heider Broisler, Israel Dantas, Magda Medeiros, Maria Denise de França, Tiago Magalhães Ribeiro e Carlos Carvalho. Na ficção, textos de Iraci Marin, Idicampos, Mónica Palacios, Ney Alencar, Roberto Schima e Sellma Luanny, além de poemas, crônicas, resenhas e artigos de assuntos variados.
A revista tem distribuição gratuita e esta edição pode ser baixada aqui. Números anteriores também estão disponíveis.

sexta-feira, 3 de novembro de 2023

Lançamento: Colapso, Roberto Denser

Está em pré-venda Colapso, primeiro romance do escritor paraibano Roberto Denser que, anteriormente, publicou diversos contos de horror e mistério em edições digitais de autor. Neste livro, Denser envereda pela ficção científica pós apocalíptica, sem se afastar contudo do gênero do horror. 
Diz o texto de apresentação: "No rescaldo de um desastre global, pequenos grupos de sobreviventes enfrentam uma luta desesperada pela vida nesse ambiente estéril e hostil que se tornou nosso planeta. As cidades vívidas e imponentes são agora ruínas vazias, fantasmas de concreto onde a busca por comida — por carne humana — se transformou em uma batalha de sobrevivência diária. Tudo e todos estão em colapso, vísceras aparentes de uma moralidade perdida, a confiança se torna uma moeda rara, e a empatia um sentimento distante de quando o céu ainda era azul".
Para os leitores veteranos de ficção científica esse cenário não é novidade e conta inclusive com um cânone próprio. Todos os tributos devem ser prestados a Só a terra permanece (Earth abides), de George R. Stewart, Estrada para o amanhecer (Road to nightfall), de Robert Silverberg e A estrada (The road) de Cormac McCarthy. Pouco há a dizer no ambiente para além destes três monumentos mas, ainda assim, a ficção pós-apocalíptica é um subgênero popular, que conta com centenas de títulos, inclusive de autores consagrados. Mesmo entre os autores brasileiros temos boas histórias contadas, como Sozinho no deserto extremo, de Luiz Brás, Fome, de Tibor Moricz e, mais recentemente, O apocalipse amarelo, de Diego Aguiar Vieira, entre outros. Um diálogo bastante vivo e relevante em tempos em que se matam crianças com mísseis de longo alcance. 
O livro tem 448 páginas e encadernação com capas duras. O lançamento está prometido para o dia 28 de novembro.

quinta-feira, 2 de novembro de 2023

Lançamento: Vespeiro, de Irka Barrios

Está em pré-venda a coletânea de contos de horror e mistério Vespeiro, da escritora gaúcha Irka Barrios que, com o romance Lauren, foi finalista do Prêmio Jabuti em 2020.
Diz o texto de divulgação: "Vespeiro apresenta trinta narrativas ferozes, violentas e perturbadoras. Imagens insólitas como os dedos mastigados de uma jovem, assassinatos, sequestros e paisagens devastadas encontram a harmonia predadora de um livro costurado com ferocidade. Vespeiro transita entre os horrores cotidianos, e apresenta os prazeres e dissabores da alma humana, especialmente a feminina. Maternidade, sexualidade, o fel dos relacionamentos mais intempestivos são matéria-prima para suas criações. Em suas histórias, vivenciamos o andar apressado por ruas mal iluminadas, o apetite descontrolado dos homens e o horror do confinamento. O resultado é a fúria das palavras, uma ferroada brutal diante da loucura controlada de seus personagens. Dilemas pulsam e encontram uma redenção ferina a cada novo desfecho". 
O livro, que é sua primeira publicação pela Darkside Books, tem 240 páginas e acabamento com capas duras, padrão das caprichadas publicações da editora. O lançamento está prometido para o dia 28 de novembro.

quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Escambanáutica 2, Ano 3

Está circulando o segundo número do terceiro ano de publicação da revista Escambanáutica, editada por Wilson Júnior para o Coletivo Escambau. 
A publicação é inteiramente dedicada à literatura fantástica brasileira produzida por novos autores, e é  realização da Secretaria de Cultura do Ceará com apoio do XII Edital Ceará de Incentivo às Artes.
Este número tem 62 páginas e traz contos de Elissa R. Neves, Iariny Carvalho e Bruno Vial. A ilustração da capa é de Nathália Pimentel. 
A revista está disponível para venda aqui; com alguma sorte, é até possível encontrá-la de graça. 
Também existe aqui um projeto de financiamento coletivo para ajudar a sustentar a Escabanaútica, bem como outras publicações do Coletivo Escambau.