A coleção Ficção de Polpa da Não Editora de Porto Alegre, formada por antologias de contos de gênero, tem escolhido um tema específico para cada edição. Os primeiros quatro números atenderam os gêneros terror, ficção científica, fantasia e crime. O quinto é Ficção de Polpa: Aventura!, publicado ainda em 2012 e que me chegou às mãos pela gentileza de Simone Saueressig, autora presente no volume. Contudo, isso faz com que a antologia não tenha um tema específico, uma vez que a aventura pode estar no bojo de qualquer história, independente do gênero. E isso pode ser observado no amplo espectro de gêneros que os autores experimentaram na edição, passando por histórias de crime, ficção científica, fantasia, piratas, guerra e selva. São sete histórias ao todo, cinco delas de autores brasileiros e duas de estrangeiros.
Após uma ligeira introdução, em que o editor Samir Machado de Machado defende uma literatura de emoções fortes que remetam à experiência do desbravamento de espaços desconhecidos, podemos ler "Por favor, não toque nos dinossauros", do gaúcho Bruno Matos, conto de ficção científica no qual um paleontólogo brasileiro é convidado a participar de uma iniciativa científica numa ilha secreta, não por acaso o mesmo lugar em que foi filmado o longa metragem Jurassic Park, apresentado ao mundo como se ficção fosse, mas onde dinossauros vivem de verdade. A história tem uma longa introdução em que o protagonista é cooptado para aceitar o trabalho mas, quando a ação se desloca para a ilha, embala um ritmo mais veloz e fantasioso.
O segundo conto é "Melhor servido frio", de Carlos Orsi, autor paulista conhecido entre os leitores de ficção científica e terror que, nesta história, aproveita a experiência que teve ao participar de uma excursão à Antártida para contar sobre um crime de vingança motivado por um triângulo amoroso e pela competitividade profissional entre pesquisadores residentes naquele continente.
A terceira história é "A igreja submersa", de Simone Saueressig, experiente autora gaúcha muito ativa no ambiente da fc&f. Ela também conta a história de um crime, toda ela passada no campanário de uma velha igreja de um vilarejo inundado pelas águas de uma barragem. Quando chega ao local um fotógrafo inspirado pela memória de sua falecida esposa – uma historiadora que defendia o valor das pinturas da catedral –, é rendido por um grupo de criminosos que pretendem recuperar um antigo tesouro submerso nas profundezas do templo arruinado.
A seguir temos "A joia de Évora", do norte-americano radicado em Porto Alegre Christopher Kastensmidt, fantasia passada no período colonial brasileiro. Conta sobre dois homens manipulados por uma mulher que, juntos, resgatam um antigo tesouro pirata de uma caverna, mas um deles é traído e atirado em um precipício. Contudo, o homem não morre da queda e, enquanto agoniza de fome e sede na escuridão, é encontrado por um índio velho que trata dele e, aos poucos, restaura sua saúde, não antes de obrigá-lo a perdoar seus algozes. Mas ele ganha mais que sua integridade no processo. Senhor de habilidades sobrenaturais, o homem vai atrás de seus antigos comparsas para retomar uma parte muito especial do tesouro.
"Virtude selvagem", do gaúcho Julio Ricardo da Rosa, inicia como uma história de piratas, com os marujos sendo severamente exigidos pelo seu impiedoso capitão para transportar e enterrar um grande tesouro em meio à floresta tropical. Feito o serviço, o capitão decide executar seus homens para manter o segredo a salvo, mas um deles reage, mata o corsário e foge pela floresta desconhecida, tentando retornar ao seu amado oceano e reconstruir sua vida.
A melhor história do volume é "Seis quilômetros", do também gaúcho Carlos André Moreira, tensa e surpreendente narrativa sobre os pracinhas brasileiros na Itália, numa missão perigosa já no final da guerra, depois da tomada de Monte Castelo, quando os alemães preparavam uma contra ofensiva que poderia mudar os rumos da guerra. As descrições são vivazes e convincentes, recriando com competência o clima limítrofe dos combates daquele conflito.
Fechando a antologia, temos "O Aranha", do norte americano Arthur Olney Friel (1855-1959), autor pulp que desenvolveu uma obra vinculada à vida selvagem. A história conta sobre os planos sinistros de um alemão, chamado de Aranha por causa de seu comportamento semelhante ao referido animal. Acostumado a obter o que quer a qualquer custo, Aranha é um homem violento, que acabou na selva amazônica fugindo de crimes anteriores, e sua índole perversa não tarda a emergir. Perseguido por seus ex-colegas de trabalho, Aranha vai lançar mão de toda sua maligna habilidade para obter o que ainda deseja.
O volume também apresenta um making off da capa, que tem arte de Jader Corrêa e Matias Strebb, além de uma seleta de antigos "reclames" de jornal entremeados aos contos que, somado à apresentação gráfica que simula o desgaste das páginas, aos textos sempre apresentados em duas colunas e às ilustrações que abrem cada conto – por Jéssica Albuquerque, Rodjer Goulart, Romano Corá, Elvis Moura, Fernando Gil e do próprio editor –, simula um divertido clima pulp que só não é mais autêntico porque a literatura brasileira nunca o teve de fato.
Ficção de Polpa: Aventura! é uma leitura agradável e interessante, indicada para ventilar a mente que está cansada de mesmices.
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