terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Resenha: Contos de terror

Contos de terror, Camilo Prado, org. 166 páginas Ilustrações internas e capa de Angelo Agostini. Edições Nephelibata, Desterro, 2016.

O gênero do horror sempre teve uma convivência mais íntima com o mainstream literário brasileiro, e não é difícil para o leitor atento identificar obras sombrias na bibliografia de uma infinidade de autores consagrados. Isso acontece devido a uma fase importante da arte literária, que acorreu entre o final do século 19 e o início do século 20, que os pesquisadores chamam de Decadentismo. Esse movimento artístico, herdeiro tardio do gótico, que em tudo reflete aos protocolos do horror como o conhecemos hoje, foi bastante popular na Europa – especialmente na França – e, por conseguinte, sua influência atingiu o Brasil em cheio, daí a razoável prodigalidade com que esse tipo de texto foi praticado, em comparação a outros gêneros da literatura especulativa.
Contos de terror, antologia organizada pelo pesquisador Camilo Prado para a editora independente Nephelibata, buscou reunir uma amostra da escola decadentista brasileira, para o que o organizador estabeleceu uma regra de ouro: só publicar contos em que os elementos tétricos fossem decorrentes de uma ação natural. Ou seja, nada de assombrações, demônios e outras manifestações do sobrenatural. Trata-se, portanto, de uma antologia de terror no sentido estrito, em que são apresentadas as faces mais sombrias do ser humano a partir da arte de autores renomados, quase todos em domínio público, numa tiragem muito pequena: apenas 70 exemplares numerados produzidos artesanalmente pelo editor. Este volume é uma espécie de lado B de uma publicação anterior, a antologia Contos decadentes brasileiros, já esgotado, mas que a editora pretende dar sequência com dois novos volumes que estão no prelo.
Outro aspecto interessante adotado pelos editores foi a manutenção da grafia da época, ou seja, os textos são apresentados da mesma maneira em que foram vistos originalmente, com as regras ortográficas da virada do século 19, o que dá um sabor especial à leitura, assim como as ilustrações do jornalista ítalobrasileiro Angelo Agostini, um dos primeiros ilustradores editoriais do país.
São quinze os textos presentes neste volume, de autoria de quatorze autores: Coelho Netto, Lucilo Varejão, Viriato Corrêa, Domicio da Gama, João do Rio, Julia Lopes, Humberto de Campos, Théo-Filho, Rodrigo Octavio, Monteiro Lobato, Carlos de Vasconcelos, Baptista Junior, Gastão Cruls e Medeiros e Albuquerque.  Alguns nomes são identificados com a literatura especulativa – como Humberto de Campos, João do Rio, Coelho Netto, Gastão Cruls e Monteiro Lobato –, mas a maior parte dos nomes é mesmo uma grata novidade. O organizador cuidou para que cada um deles fosse devidamente apresentado ao leitor numa breve biografia que antecede cada um dos contos, e ajuda bastante a contextualização do que será lido.
O conto que abre a seleta é "Na treva", de Coelho Netto, autor extremamente popular em sua época, dono de um estilo rebuscado com pendão para o inusitado, que conta a história vertiginosa de um grupo de passageiros a bordo de um trem noturno aparentemente desembestado.
Outro texto de destaque é "A peste", de João do Rio, que desenvolveu em seus contos um importante trabalho de registro da cultura carioca de sua época. Neste, o drama hospitalar sobre um surto de varíola.
"Madrugada negra", de Viriato Corrêa, não é de todo desconhecido. Trata-se de um relato em primeira pessoa, em que um homem conta a um grupo de amigos uma história de grande infortúnio. Contar uma história dentro de outra é um formato recorrente neste tipo de narrativa, e o autor de Cazuza, membro da Academia Brasileira de Letras, desfia aqui uma tragédia advinda da covardia de um homem.
Julia Lopes é a única mulher no grupo, e também única a comparecer com dois textos.  "Sob as estrellas" envereda pela trágica relação de amor de um casal separado pela insensibilidade do homem, e "As rosas" é a história triste e tétrica de um jardineiro que perdeu a filha.
Outra história bastante antologizável é "O juramento", de Humberto de Campos, sobre um homem que testemunhou a amada ser devorada por índios canibais.
Gastão Cruls, autor do importante romance A Amazônia misteriosa, aparece aqui com "G.C.P.A.", também uma narrativa hospitalar sobre um homem que padece de uma doença rara.
"Bugio moqueado" é o texto de Monteiro Lobato, um dos maiores clássicos do terror brasileiro, originalmente publicado na coletânea Negrinha (1920), com o relato sobre a técnica educativa de um homem muito mau.
Também vale comentar aqui o texto de Ridrogo Octavio, "Gongo Velho (Cousas de outro tempo)", uma história pungente de exploração e preconceito que, ainda que tenha sido publicada em 1932, tem forte apelo em nossos dias.
A antologia é muito equilibrada e demonstra o quanto o Decadentismo foi prolífico no Brasil. Sabemos que muitos desses autores não se negavam a avançar nos domínios do sobrenatural quando lhes convinha, como se pode perceber na leitura de antologias como Páginas de sombra (Casa da Palavra, 2003) e Contos macabros (Escrita Fina, 2010). Mesmo sem o componente metafísico, Contos de terror junta-se a elas para contribuir com o estudo da presença da ficção de horror na literatura brasileira. Sem esquecer que também é, por si mesma, uma leitura perturbadora e, porque não, divertida.

QI 143

Está circulando o número 143 do fanzine Quadrinhos Independentes-QI, editado por Edgard Guimarães, dedicado ao estudo dos quadrinhos destacando a produção independente e os fanzines brasileiros.
A edição tem 32 páginas e traz a sequência do depoimento de José Ruy sobre o periódico português Tintin, artigo de Lio Guerra Bocorny sobre algumas experiências editoriais da Ebal nos anos 1960, e quadrinhos de Chagas Lima, Luiz Cláudio Lopes Faria, Eduardo Marcondes Guimarães e do editor. Completam a edição as colunas "Mantendo contato", "Fórum" e "Edições independentes" divulgando os lançamentos de fanzines do bimestre. A capa tem uma ilustração do editor, colorizada manualmente.
Junto à esta edição, os assinantes recebem Artigos sobre Histórias em Quadrinhos 5: Roy Rogers/Dale Evans, fascículo de 12 páginas com um estudo de autoria do colecionador português Carlos Gonçalves, com muitas e belas capas de edições raras desses populares personagens.
O QI é distribuído exclusivamente por assinatura, mas sua versão digital estará disponível em breve no saite da editora Marca de Fantasia, aqui. Algumas das edições anteriores recentes podem ser lá encontradas. Mais informações com o editor pelo email edgard@ita.br.

Anuário no Adorável Noite

O escritor Adriano Siqueira, autor de histórias de horror, editor do fanzine Adorável Noite e sempre muito ativo nas redes sociais, realizou por algum tempo uma série de entrevistas em vídeo com autores, editores e personalidades ligadas à ficção fantástica brasileira. Todas as 91 entrevistas estão agora disponíveis no canal Contos de Vampiros e Terror, aqui. Destaque para as entrevistas com Eduardo Spohr, Luiz Bras, Roberto de Sousa Causo, Amanda Reznor, Giulia Moon, Raphael Draccon, Rosana Rios, Helena Gomes, Max Mallmman, Nazareth Fonseca, e Regina Drummond, entre outros.
Até o Anuário Brasileiro de Literatura Fantástica mereceu a atenção de Lord Dri numa rápida conversa com o autor Cesar Silva (que pode ser vista aqui) gravada em 2010 na Livraria Martins Fontes Paulista, durante o lançamento da edição de 2009.

Trasgo: Ano 1

A revista eletrônica de ficção fantástica Trasgo, editada por Rodrigo van Kampen e totalmente dedicada à produção nacional, está empenhada num novo projeto: a publicação de uma edição em papel. Na verdade, trata-se de uma antologia, reunindo todos os contos publicados pela Trasgo em suas quatro primeiras edições, mais três contos inéditos.
Intitulada Trasgo: Ano 1, a antologia trará, em 376 páginas, 26 contos de ficção científica e fantasia, prefaciados por Roberto de Sousa Causo, que também participará com um conto na seleção. Além dele, estarão no livro Ademir Pascale, Albarus Andreos, Ana Lúcia Merege, Caroline Policarpo Veloso, Claudia Dugim, Claudio Parreira, Cristina Lasaitis, Érica Bombardi, Frederico de Oliveira Toscano, Gael Rodrigues, George Amaral, Gerson Lodi-Ribeiro, Hális Alves, Jessica Fernanda de Lima Borges, Jim Anotsu, Karen Alvares, Liége Báccaro Toledo, Marcelo Porto, Mary C. Muller, Melissa de Sá, Tiago Cordeiro, Victor Oliveira de Faria, Enrico Tuosto, Lucas Ferraz e o próprio organizador Rodrigo van Kampen.
Van Kampen está promovendo uma campanha no saite de financiamento coletivo Catarse para viabilização financeira do projeto, com as costumeiras recompensas que caracterizam o esquema. Participe aqui.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

Carnaval com Letras

No auge do verão 2017, a fc&f dá o ar de sua graça nos lançamentos na editora Companhia das Letras.
Do escritor chileno Roberto Bolaño (1953-2003) chega O espírito da ficção científica, um romance escrito em 1984 que estava inédito até hoje. Diz a divulgação: "conta a história de Remo Morán e Jan Schrella, dois jovens escritores obcecados por poesia e ficção científica. Enquanto o primeiro tenta incansavelmente encontrar seu espaço na literatura, o segundo passa os dias enviando cartas delirantes a seus autores favoritos de ficção científica". Não é um livro de fc, portanto, mas sobre autores de fc, metaficção que caracteriza a obra do autor.
Senhor D., do acadêmico do MIT Alan Lightman, é uma espécie de autobiografia de Deus: "Depois de uma longa existência no Vazio, o onipotente Senhor D. resolve experimentar e criar o tempo, o espaço e a matéria. Aos poucos, surgem também os astros celestes, as primeiras formas de vida e os seres pensantes. E com eles, os dilemas inesperados até mesmo para o Criador — que parecia ter tudo sob controle". Também é um livro que não é o que parece. Antes de ser uma fantasia, é de fato uma discussão filosófica sobre a ciência e a religião.
Pelo selo Seguinte, dedicado a ficção para jovens-adultos, chega A traidora do trono, da canadense Alwyn Hamilton.  Segundo volume da série iniciada em 2016 com A rebelde do deserto, trata-se de uma fantasia oriental com toques de faroeste: "Em meio às perigosas batalhas, Amani é traída e acaba se tornando prisioneira no palácio. Enquanto pensa em um jeito de escapar, tenta se aproximar do sultão para descobrir informações úteis para a causa rebelde. Contudo, quanto mais tempo passa ali, mais ela questiona se o governante é de fato o vilão que todos acreditam, e quem são os verdadeiros traidores do país".
Há alguns meses, uma moda tão avassaladora quanto passageira inundou as livrarias com livros para colorir sobre diversos temas. As editoras correram para aproveitar a onda mas a produção que atendesse aquela demanda impossibilitou que, logo de saída, surgissem produtos ligados às franquias.
Por isso é que, só agora quem gosta de pintar pode finalmente praticar seus dotes estéticos com A seleção para colorir, com ilustrações de Sandra Suy no popular universo criado por Kiera Cass. "Com vinte ilustrações de momentos emblemáticos dos cinco volumes da série, assim como vinte frases preferidas dos fãs, este é o livro ideal para quem está com saudades de A Seleção e quer passar um tempinho a mais nesse universo inesquecível".
Anna e o planeta, do escritor norueguês Jostein Gaarder (autor de O mundo de Sofia), mistura fantasia e viagens no tempo para contar a história muito curiosa: "Pouco antes de completar dezesseis anos, Anna começa a receber mensagens em seus sonhos. Preocupados, os pais resolvem levá-la a um psiquiatra, mas o médico não acha que exista algo errado. Na verdade, o excêntrico dr. Benjamin acredita que parte do que ela vê nos sonhos é real, como o agravo do aquecimento global e a consequente extinção de vários animais. Ele está certo, pois Anna está observando o mundo através dos olhos de Nova, sua bisneta que vive em 2082 e está prestes a fazer dezesseis anos".
Pelo selo Penguin Companhia, a coletânea O livro de Moriarty reúne todas as seis histórias (cinco contos e um romance) em que o detetive Sherlock Holmes enfrenta seu nêmesis: "O Napoleão do crime. É assim que Arthur Conan Doyle define o professor James Moriarty, arquirrival de Sherlock Holmes e um dos grandes vilões da literatura universal. Não há crime em Londres, do mais banal dos roubos ao mais terrível dos assassinatos, que não tenha sua mão". Um livro tanto para fãs como para quem ainda não teve a oportunidade de conhecer este personagem singular.
Fechando esta série, o selo Suma das Letras apresenta A rainha de Tearling, de Erika Johansen, primeiro de uma trilogia que mistura distopia e fantasia medieval: "Quando a rainha Elyssa morre, a princesa Kelsea é levada para um esconderijo, onde é criada em uma cabana isolada, longe das confusões políticas e da história infeliz de Tearling, o reino que está destinada a governar. Dezenove anos depois, os membros remanescentes da Guarda da Rainha aparecem para levar a princesa de volta ao trono – mas o que Kelsea descobre ao chegar é que a fortaleza real está cercada de inimigos e nobres corruptos que adorariam vê-la morta. Mesmo sendo a rainha de direito e estando de posse da safira Tear – uma joia de imenso poder –, Kelsea nunca se sentiu mais insegura e despreparada para governar. Em seu desespero para conseguir justiça para um povo oprimido há décadas, ela desperta a fúria da Rainha Vermelha, uma poderosa feiticeira que comanda o reino vizinho, Mortmesne. Mas Kelsea é determinada e se torna cada dia mais experiente em navegar as políticas perigosas da corte.
Como ainda temos pela frente algumas semanas de calor, vamos aproveitar a maré enquanto esperamos pelas águas de março.

sábado, 11 de fevereiro de 2017

Resenha: Nova era

Mundo novo 3: Nova era (The revival), Chris Weitz. 216 páginas. Tradução de Álvaro Hattnher. Editora Companhia das Letras, Selo Seguinte. São Paulo, 2016.

Com este livro, originalmente publicado em 2016 nos EUA, chega ao fim a saga da tribo de adolescentes novaiorquinos que sobreviveu ao apocalipse depois que um vírus altamente agressivo dizimou toda a população adulta na América.
Nos volumes anteriores, Mundo novo (2014) e Nova ordem (2015), vimos como Jefferson, Donna, Petter, Crânio e seus amigos tentam, a todo custo, encontrar uma cura para a praga antes que todos cheguem a idade fatal. Para isso, abandonaram a segurança de sua aldeia protegida por barricadas e algumas armas, e lançaram-se numa jornada de esperança pela Nova York devastada e ocupada por adolescentes violentos, psicopatas, antropófagos, escravagistas e outros tipos igualmente perigosos. A cura foi enfim encontrada, mas ela era apenas o começo do verdadeiro problema que se desenrolava em outras partes do mundo. Na Europa e na Ásia, uma vacina foi produzida e os adultos sobreviveram, bem como toda a parafernália tecnológica a qual estamos acostumados. Mas o desaparecimento dos EUA no cenário mundial causou grandes mudanças no equilíbrio político do mundo e agora todos querem dominar o que sobrou de útil na América, o que significa "arsenal nuclear". A ideia dos governos estrangeiros, especialmente a Inglaterra, é esperar que todos morram na América para então agir com mais liberdade e segurança. Mas a cura de Jefferson os obriga a acelerar seus planos, ainda mais porque há grupos dissidentes que não querem que a nova ordem mundial seja construída sobre uma hegemonia britânica. Um desses grupos, conhecido como Reconstrução, se alia aos garotos na cruzada para salvar o que restou da América. Mas, enfim, as coisas não eram exatamente o que pareciam.
Neste terceiro e último volume, Jefferson e seus companheiros têm de lutar mais um pouco para salvar seus amigos. De volta a Nova York, o plano de Jefferson de unir as gangues em torno da cura fracassou. Traído pela Reconstrução, a "Bola de futebol" e o "Biscoito", os dispositivos de lançamento de mísseis nucleares encontrados no prédio da ONU onde haviam sido abandonados no auge da crise, acabam nas mãos da tribo de Uptown, um grupo belicoso e muito bem armado liderado por um psicopata chamado Evan. Caçado pelos garotos de Uptown, Jefferrson tem de fugir e encontrar algum apoio, e ele vem na pessoa de Donna que, finalmente, retorna à Nova York acompanhada de um comando militar britânico altamente equipado cuja missão é resgatar os dois equipamentos que estão com Evan. A chama do amor entre Jeff e Donna foi severamente afetada pelos eventos do volume anterior. Ainda há uma fagulha, mas nada pode prosperar enquanto o mundo estiver a beira do desastre nuclear total. Contudo, não é uma opção permitir que os dispositivos caiam nas mãos dos britânicos, nem os russos ou dos chineses, que também enviaram tropas para a ilha com o mesmo fim. A esperança repousa na tribo do Harlen, que Jefferson traiu no passado, e o reencontro entre eles pode ser imprevisível.
Weitz, que tem experiência como roteirista e diretor de cinema, desenvolve sua trama através de depoimentos e registros pessoais de personagens-chaves, de modo que, apesar na narrativa ser linear, o leitor obtém uma visão tridimensional do ambiente e das relações entre os diversos núcleos narrativos. O autor tem grande habilidade em modular as vozes dos personagens, mas a produção gráfica ajuda dando a cada um deles uma tipografia diferente, que combina com sua psicologia. E Weitz fez questão de dar personalidade variada a eles, adotando uma linha inclusiva que privilegia minorias e as trata com dignidade. Por exemplo, Petter, que é negro e homossexual, finalmente ganha neste volume seu próprio núcleo narrativo.
Também percebe-se que Weitz se esforçou por atualizar o ambiente, referindo-se a fatos e personalidades mais recentes, como Donald Trump, o Estado Islâmico, por exemplo, que não chegaram a ser citados nos volumes anteriores. Para uma leitura atual, por certo que tais citações acrescentam realismo, mas são elementos datados que podem envelhecer com o passar dos anos.
Apesar de toda a violência, Nova era é um livro para leitores jovens, de leitura fácil e sem grandes complexidades filosóficas, a não ser nas entrelinhas, pois o ambiente permite insights mais sofisticados aqui e ali.
Em toda grande história, vale mais a jornada do que a chegada, e não é diferente com a trilogia de Chris Weitz. Se é preciso um final, então que seja. Por mim, eu estaria muito disposto a seguir acompanhando as desventuras de Jeff e os sobreviventes de sua tribo nesse mundo desfigurado pela peste. Quem sabe, talvez não tenha sido mesmo o The end definitivo.

Juvenatrix 183

Está disponível a edição de fevereiro do fanzine eletrônico de horror e ficção científica Juvenatrix, editado por Renato Rosatti.
A edição tem 13 páginas e traz resenhas aos filmes As bonecas da morte (The psychopath, Inglaterra, 1966), A criatura da mão azul (Die blaue hand, Alemanha Ocidental, 1967), A cruz do diabo (La cruz del diablo, Espanha, 1975), O fantasma de Frankenstein (The ghost of Frankenstein, EUA, 1942), Fantasmas que ainda vagam (Ghosts that still walk, EUA, 1977), Latidos de pánico (Espanha, 1983), Sol (Brasil, 2017) e O uivo da bruxa (Cry of the banshee, Inglaterra, 1970). Divulgação de fanzines, livros, filmes e bandas independentes de rock extremo complementam a edição. A capa traz uma ilustração de Angelo Junior.
Para obter uma cópia, basta solicitar pelo email renatorosatti@yahoo.com.br.

Conexão Literatura 20

Está circulando o número 20 da revista eletrônica Conexão Literatura, editada por Ademir Pascale pela Fábrica de Ebooks.
A edição tem 52 páginas e destaca na sua capa o trabalho das escritoras Jaqueline e Micheline Ramos, mais conhecidas como Jack Michel, autoras do romance 1 anjo MacDermot, publicado pela editora Drago. Também são entrevistados na edição os escritores Adiel Machado (Selvageria urbana), Kathia Brienza (Não é com vinagre que se apanham moscas), Fernanda W. Borges (O reverso do destino), Filipe Santos (Luas de sangue), Caio Mirabelli (As consciências do universo) e o artista gráfico Denis Lenzi. A revista ainda traz um conto de Mauricio Campos e crônicas de Misa Ferreira, Dione Souto Rosa e Míriam Santiago. A coluna "Conexão Nerd" divulga o novo canal da revista no Youtube, que pode ser conferido aqui.
A revista é gratuita e pode ser baixada aqui. Edições anteriores também estão disponíveis.

domingo, 5 de fevereiro de 2017

Essenciais de 2016 - Autores brasileiros

Apesar da crise, 2016 foi um ano favorável para a ficção especulativa brasileira. Não na quantidade, que está em queda livre, mas pelo menos a qualidade do material publicado tem se sustentado, o que aumenta o desempenho médio da produção nacional.  Também observamos o esboço de um núcleo semi-profissionalizado no segmento, com a presença recorrente de determinados autores com novos livros nas livrarias, o surgimento de periódicos sérios, inclusive de natureza acadêmica. Ainda que não necessariamente proveitosos do ponto de vista financeiro,  é importante a conquista desses espaços, que acenam com um futuro alvissareiro a longo prazo, especialmente quando esta crise passar – e ela vai passar.
No que se refere a ficção nacional, os romances ocupam a linha de frente, com treze títulos inéditos e uma republicação importante. Como tem sido a tendência, o gênero da fantasia continua a ser o mais praticado e no qual os autores parecem se sentir mais a vontade. Dois contumazes best-sellers aparecem aqui, ambos pela Editora Rocco: André Vianco, com Dartana, pelo selo Fábrica 231, uma história dark fantasy no ambiente medieval, e Carolina Munhóz, com Por um toque de sorte, segundo volume da série Trindade Leprechaum, pelo selo Fantástica, uma história contemporânea que, assim como Vianco, se desenvolve em torno de mitologias europeias.
Flávia Muniz também é uma autora que podemos classificar como best-seller. Embora seu nome não seja tão lembrado quanto os dois autores acima citados, Flávia está em ação desde os anos 1980 e seu livro Os noturnos é muito bem sucedido comercialmente. A autora publicou em 2016 o romance O manto escarlate, pela editora SESI-SP, que também envereda pela dark fantasy medieval.
Entre os estreantes, há três ótimos destaques. Santiago Santos, autor do saite de microcontos Flash Fiction, publicou seu primeiro romance, Na eternidade sempre é domingo, pela editora Carlini & Cantato, romance fix-up formado por várias narrativas independentes em forma de relato de viagem pelos Andes boliviano e peruano.
Alex Mandarino publicou O caminho do Louco, primeira parte da série Guerras do Tarot, pela editora Avec, ágil aventura de fantasia urbana com toques de mistério. E Caio Alexandre Bezarrias, com Shimandur: A cidade da chuva, pela editora Devir Livraria, fantasia passada na metrópole paulistana assolada por uma chuva interminável.
Antes de passar adiante, convém destacar aqui um livro de estremo valor, que precisa estar nesta relação, apesar de ter autor, em tese, estrangeiro. Trata-se do texano Christopher Kastensmidt, americano radicado no Brasil que aqui tem desenvolvido sua carreira como escritor, privilegiando uma ficção de caráter brasilianista que poucos autores nacionais ombreiam. Depois de publicar vários contos em antologias, Kastensmidt lanço em 2016, pela Devir Livraria, o romance fix-up de fantasia A Bandeira do Elefante e da Arara, que compila todos os dez contos do ciclo das aventuras de Gerard e Oludara, um holandês e outro africano, enfrentando seres mitológicos ao longo de uma ampla peregrinação pelo território do Brasil colonial.
A ficção científica tem se recuperado nos últimos anos, depois de um período de estagnação em que pouco se publicou no gênero. Os representantes de 2016 também são pesos pesados do segmento: Alexey Dodsworth, que em 2015 foi reconhecido pelos fãs com o prêmio Argos, lançou O esplendor, pela editora Draco, história cósmica sobre um planeta de luz eterna que é agitado quando surge um menino que pode dormir e sonhar.
Mustafá Ali Kanso, que é também um nome reconhecido no fandom, publicou O mesmo Sol que rompe os céus, pela editora Fragmentos, com uma história sobre o encontro de dois personagens com experiências bizarras.
Luiz Brás – reconhecido em alguns círculos como o multipremiado Nelson de Oliveira – tem mantido uma forte produção de fc&f nos últimos anos e, em 2016, apresentou aos leitores Não chore, pela editora Patuá, uma ficção anarquista que discute o sistema prisional. Pela mesma editora, Oliveira republicou o esgotado Subsolo infinito, originalmente publicado em 2000, uma perturbadora fantasia urbana sobre a identidade.
O horror é um ambiente razoavelmente assentado no mercado, sempre com uma produção equilibrada e estável. Rosana Rios é uma dama da literatura especulativa nacional, com dezenas de títulos publicados ao longo de sua produtiva carreira iniciada em 1988. Em 2016, lançou Olhos de lobo, pela editora Farol Literário, com uma história que mistura licantropia e nazistas no Rio Grande do Sul.
Pedro Cesarino, reconhecido pesquisador acadêmico da cultura dos povos nativos, vencedor do Jabuti com sua tese de doutorado Oniska: Poética do xamanismo da Amazônia, estreou em 2016 na ficção com Rio acima, pela editora Companhia das Letras, que aproveita sua experiência no tema para contar uma história de terror nas selvas do Xingu, na linha Coração das trevas, de Joseph Conrad.
Também a Companhia das Letras publicou Jantar secreto, de Raphael Montes, uma história de terror urbano deste autor que tem sido muito comentado nos últimos anos por sua ficção de aspectos sombrios.
Coletâneas e antologias representam um papel importante no ambiente da fc&f nacional. Como há poucas revistas publicando ficção, esse modelo editorial, que reúne num mesmo livro textos curtos de diversos autores e estilos, tem sido a sustentação do exercício criativo e revelado muitos autores de qualidade, sem esquecer que é na ficção curta que os autores brasileiros geralmente têm os melhores resultados.
Como em quase tudo, 2016 testemunhou uma forte queda no número de antologias e coletâneas publicadas no país, mas ainda assim é preciso reconhecer o esforço dos editores em investir no formato.
Entre as coletâneas – livros que reúnem textos de um único autor –, o destaque vai para O teorema das letras, título póstumo de André Carneiro (1922-2014), o mais bem sucedido autor brasileiro de ficção científica, que traz cinco contos inéditos que representam a intensa criatividade de Carneiro, mesmo no fim da vida.
No gênero do horror, o ótimo Carlos Orsi apresentou Mistérios do mal, pela editora Draco, que traz contos que unem mitologias e cosmologias típicas da weird fiction, amalgamadas a cenários e personagens brasileiros, como é característico em sua obra.
Também é no horror sobrenatural que se apresenta o escritor gaúcho Duda Falcão, com a coletânea Treze, pela editora Avec (publicada com data de 2015), não por acaso com treze contos ao estilo pulp fiction, com muito sangue, monstros, bruxas e demônios.
Entre as antologias – livros que publicam trabalhos de autores diferentes – os destaques da fantasia são Estranha Bahia, organizada Alec Silva, Ricardo Santos e Rochett Tavares para a editora EX!, com sete contos cujo fio condutor é, como já diz o título, o estado da Bahia.
E também Medieval: Contos de uma era fantástica, organizada por Ana Lúcia Merege e Eduardo Kasse para a editora Draco, com nove textos de autores bem avaliados, todos obviamente num cenário medieval, uma espécie de segundo volume a antologia Excalibur, dos mesmos organizadores e editora, publicada em 2013.
A antologia essencial na ficção científica em 2016 é Dinossauros, organizada por Gerson Lodi-Ribeiro para a editora Draco, um tema recorrente em antologias nacionais e estrangeiras, mas que traz 16 histórias inéditas de autores experientes e conhecidos no fandom.
Fechando esta seleção, a antologia Contos de terror, organizada por Camilo Prado para a editora Nephelibata, com 15 textos curtos, quase todos em domínio público, numa seleta de histórias tenebrosas de viés realista, por autores clássicos da literatura brasileira que pode surpreender os leitores menos avisados, num modelo que tem recebido razoável atenção dos antologistas nos últimos anos.