sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Metrópolis

Osamu Tezuka (1928-1989), um dos mais influentes quadrinhistas japoneses, é considerado o pai do mangá moderno. Isso porque ele transformou a arte dos quadrinhos no Japão, dando-lhe identidade cultural e tornando-a um verdadeiro fenômeno de massa.
Contudo, Tezuka não atingiu esses objetivos através de uma proposta nacionalista, ao contrário. Ele abraçou com vontade as características do quadrinho ocidental, especialmente o norte-americano, que era extremamente influente no seu país nos anos pós-guerra.
E isso fica muito claro na leitura de um de seus clássicos, Metrópolis, publicado originalmente em 1949, traduzido no Brasil em 2010 pela editora New Pop.
Metrópolis foi confessamente inspirado no filme homônimo de Fritz Lang, de 1927, mas Tezuka conta, no posfácio da edição brasileira, que não tinha visto o filme, mas apenas uma imagem estática da cena em que Maria, a robô, é criada. Tezuka ainda conta que queria realmente mudar o panorama do mangá japonês, então dominado pelo que ele chama de "akahon", a literatura juvenil masculina. Para isso, investiu numa longa saga de ficção científica com uma personagem feminina, ou quase isso: Michi é um androide andrógino, criado a partir de moléculas artificiais de proteína sensibilizadas pela radiação de um raro fenômeno solar. Dr Lawton, o cientista que criou Michi, o fez a mando de uma corporação criminosa internacional controlada pelo mafioso Duque Red, que domina a tecnologia dos robôs e os escraviza em suas fábricas secretas, mas anseia pela criação do super-homem, um passo adiante na tecnologia robótica. Contudo, no último momento, Lawton engana Red incendiando o laboratório e dizendo que o protótipo fora destruído no acidente mas, na verdade, o leva em segredo e passa a cuidar dele como um filho, sem lhe revelar a origem artificial. Anos depois, Red vai descobrir que foi enganado por Lawton e fará de tudo para retomar o controle sobre Michi.
Em meio à história, há referências a outras obras clássicas ocidentais, como a pobre vendedora de flores, inspirada no romance Os miseráveis, de Victor Hugo, a ilha em que Red promove experiências genéticas, que reporta a Ilha do Dr. Moreau, de H. G. Wells, e A ilha misteriosa, de Júlio Verne, assim como a revolta final dos robôs, que vimos primeiro na novela R.U.R, de Karel Capek, e no próprio Metropolis de Fritz Lang.
Além disso, fica patente a forte influência ocidental na estética dos desenhos de Tezuka, especialmente do trabalho de Walt Disney, de quem Tezuka emprestou Mickey Mouse sem a menor cerimônia, numa legítima sequência de antropofagia modernista. É verdade, portanto, o que o mestre falava sobre os grandes olhos dos personagens dos mangás – sua mais importante herança na arte – terem sido inspirados nos estilo da Disney.
No roteiro também percebemos a influência do quadrinho ocidental, desenvolvido em espasmos narrativos, como nas tiras dos jornais. Sem esquecer que Metrópolis adianta alguns dos temas que se tornariam frequentes na arte de Tezuka, como a troca de identidades e da luta pela liberdade.
Metrópolis atinge assim o status de um verdadeiro 'elo-perdido' na história da evolução do mangá e também do quadrinho moderno em todo o mundo, na medida em que o Japão agora realimenta a arte com sua própria estética. É Osamu Tezuka, vivo e influente.

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